domingo, 16 de setembro de 2018

A cantata "erótica" de Carl Orff


"Carmina Burana", aclamada cantata (ou oratório) baseada em textos medievais de conotação erótica, é a obra mais popular do compositor alemão Carl Orff (1895-1982). E a fama não é gratuita. A singular combinação dos naipes da orquestra, com destaque para os metais e a percussão, aliada a 3 coros (masculino, feminino e infantil), confere à composição uma sonoridade que chega até a ser hipnótica. 
Em síntese, o que os textos profanos da cantata propõem é uma espécie de parábola sobre o papel da boa ou má "fortuna" (sorte) na vida humana, determinando o destino de cada um de nós.
O fato é que disponho de 6 gravações da obra com orquestras diferentes (uma somente com canções e instrumentos medievais originais), e minha preferida era, até hoje, a de Seiji Ozawa regendo a Orquestra Filarmônica de Berlim. Surpreendentemente, depois de tanto tempo, mudei de ideia ao ouvir agora há pouco a gravação com a Royal Philharmonic Orchestra, de Londres, conduzida por Richard Cooke, que oferece um andamento mais lento e aparentemente mais adequado à obra. O curioso é que não me lembro de já ter acontecido isso comigo. Habitualmente, sou conservador e estabeleço como padrão a performance que ouço pela primeira vez (claro, quando se trata de gravação com orquestra e regente qualificados), em detrimento de qualquer outra ouvida mais tarde. Dessa vez, para minha surpresa, gostei mais da que ouvi hoje, quase 40 anos depois de ouvir a gravação com Seiji Ozawa. Literalmente, vivendo e aprendendo, afinal, sempre é possível ampliar os horizontes (e mudar de ideia!).
Cabe registrar que, em 2006, por ocasião da realização da Copa do Mundo na Alemanha, visitei Andechs, a cidadezinha onde se encontra o mosteiro que conserva o túmulo de Carl Orff, o autor da obra, estreada em 1937. Fica pertinho de Munique e vale uma esticada até lá para conhecer um típico e simpático vilarejo do interior da Baviera, que conta também com uma famosa cervejaria, mantida há séculos por monges de um mosteiro da região. Mas essa é uma outra história.


40 anos da "Varèse" e o mercado de trilhas sonoras no Brasil


Reminiscência...

Em 2003, encomendei no exterior esse cd quádruplo, comemorativo do aniversário de 25 anos da "Varese Sarabande", gravadora americana especializada em trilhas sonoras que dispõe do maior catálogo de obras do gênero.
Lá se foram 15 anos e a gravadora continua firme e forte no mercado, com títulos raros (novos e reeditados), para deleite dos amantes de scores de filmes. 
Infelizmente, embora esteja subordinada, desde fevereiro desse ano, à Universal Music, que atua no Brasil, nenhum título da "Varese" é lançado no mercado nacional há décadas, o que só ocorreu nos anos 80, na verdadeira "época de ouro" desse mercado no país. 
Bons tempos em que eu entrava na Mesbla, na Modern Sound, na Gramophone, na Bilboard, na Moto Discos, na Breno Rossi ou na Gabriela Discos e encontrava uma bancada imensa com LPs de trilhas sonoras de filmes recém-lançados nos cinemas do Rio.

domingo, 3 de junho de 2018

Imprensa e diversidade


Nos últimos anos, tenho visto uma geração inteira de novos jornalistas com graves deficiências conceituais relativas ao papel social do jornalismo e a noções elementares de ética profissional.
Não faz muito tempo, e não sei se há aqui uma necessária relação de causa e efeito, tivemos a decisão do STF dispensando a formação acadêmica (ou a graduação) para o exercício da função. 
O fato é que, acompanhando o trabalho da imprensa, não por ofício, mas por hábito mesmo, percebo, de maneira geral, um desconhecimento gritante dos princípios básicos da atividade, revelando uma prática profissional que se aproxima perigosamente da militância política e da defesa de interesses privados (leia-se patrões!) na cobertura dos acontecimentos, em detrimento de uma postura mais equilibrada que contemple a diversidade de opiniões.
Por tudo isso, penso que a imprensa brasileira precisa urgentemente se reinventar para voltar a desfrutar de um mínimo de credibilidade com a população. E voltar a desempenhar seu papel fundamental na consolidação da democracia em nosso país e na própria formação da cidadania dos brasileiros.


quarta-feira, 23 de maio de 2018

Terapia em grupo

Desgraçadamente (não consigo encontrar um termo mais apropriado), a realização da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos, duas oportunidades de ouro (e raras) para um país, uma nação, um povo, independentemente dos resultados esportivos, elevar sua autoestima a níveis sem precedentes, serviu para provocar nos brasileiros um profundo e incontido sentimento de impotência e humilhação. E não faço menção ao "7 a 1" da Copa do Mundo. Antes, nossa maior vergonha se resumisse a isso.
Refiro-me ao escândalo das obras superfaturadas para a realização dos eventos, à construção de estádios desnecessários a custos milionários e às obras de infraestrutura nas cidades-sede, inacabadas até hoje em 11 das 12 capitais. Tudo isso promovido por políticos corruptos, alguns já na cadeia, com prejuízos incalculáveis para os cofres públicos. 
Hoje, é impossível identificar um único vestígio de legado urbano, esportivo ou social para os brasileiros. Uma lástima e um fracasso talvez sem igual entre os países que já sediaram esses eventos. Pelo contrário, o que se noticia ultimamente são sérias acusações de compra de votos para sediar a Olimpíada no Rio, envolvendo as mais altas autoridades políticas e esportivas do país.
Conclusão, com tudo isso, a menos de 1 mês da Copa do Mundo da Rússia, a despeito do "esforço" publicitário nos meios de comunicação, no Rio de Janeiro, o único sinal da proximidade do evento é a troca de figurinhas do "álbum da Copa", principalmente por crianças e adolescentes. Ao contrário das edições anteriores da Copa do Mundo (e não só da realizada no Brasil), o povo carioca vem revelando pouco entusiasmo com a seleção e com o evento, o que se reflete na ausência do assunto nas conversas em geral e também na falta de decoração nas ruas e avenidas, uma "tradição" da cidade que não se repete esse ano.
Resumo da ópera, os brasileiros, e não só os cariocas, encontram-se num estado de "letargia" que não se coaduna com o temperamento festivo, confiante e extrovertido do povo. Além de melhores votos nas eleições de outubro, talvez estejamos todos necessitando mesmo é de uma boa terapia! Será que dá pra fazer em grupo?


segunda-feira, 7 de maio de 2018

Aaron Copland e o instrumento dos deuses

De Aaron Copland, compositor e teórico musical americano que se tornou uma verdadeira lenda no século XX, em seu livro "Como Ouvir e Entender Música", publicado originalmente em 1939:

"A trompa tem um timbre maravilhosamente redondo - suave, acariciante, quase líquido. Tocada em sua maior intensidade, tem uma qualidade majestosamente metálica que é o oposto do seu timbre mais suave. Se existe um som mais nobre do que o de oito trompas em fortíssimo cantando uma melodia em uníssono, eu nunca ouvi esse som. Outra sonoridade expressiva a ser obtida da trompa é a que resulta do emprego da surdina, que às vezes é produzida colocando-se a mão na boca do instrumento. Consegue-se então um som sufocado e áspero que ao ser intensificado transforma-se em algo de extraterreno, que parece vir, com efeitos mágicos, de um lugar distante".

Em outras palavras, mais sucintas, eu diria (como já disse várias vezes) que a trompa é o instrumento dos deuses! 
Dizem até que é o instrumento de orquestra mais difícil de tocar. Nem poderia ser diferente, afinal, deuses não costumam se contentar com pouco!


Perdi o trem

Meu amigo João Cantiber, músico de carteirinha, vive se referindo a mim como "maestro", até para me apresentar a outros amigos. Uma gentileza em alusão ao meu "amor" pela música. Mas acho que há mesmo alguma "verdade" nisso. Não sou maestro, claro, até porque nunca estudei ou "pratiquei" música, mas a paixão que tenho pela música orquestral me faz concluir que, se não sou maestro, deveria ter sido! 
Dizem que vocação é chamamento; é algo para o qual nascemos e nos sentimos impelidos a buscar, a seguir, a explorar, custe o que custar. Depois de uma vida inteira ouvindo música "obsessivamente" quase todos os dias, só agora estou convencido de que minha verdadeira vocação é e sempre foi a música orquestral. Não como intérprete, tocando um instrumento, porque esse nunca foi o meu desejo, mas regendo as obras na tentativa de dar vida e voz ao pensamento musical do compositor. Essa é a minha paixão e também, agora eu sei, minha grande frustração na vida. Não dei ouvidos ao chamamento, à vocação, e hoje, beirando a terceira idade, por comodismo ou mesmo covardia, vejo que desprezei tudo isso. Enfim, o trem passou e deixei de embarcar para aquela que deveria ser a maior e melhor viagem da minha vida.


Linguagem universal

É curioso como a música "fala" para todos, independentemente de credo, etnia, cultura ou nacionalidade. Isso é o que faz dessa arte a mais "ecumênica" e agregadora criação do homem (ou de Deus). É uma linguagem universal que pode ser compreendida por qualquer ser humano, esteja onde estiver, tenha a origem que tiver. 
Por isso, nada aproxima mais os seres humanos do que a música, daí que a construção de um futuro comum e harmonioso em nossa civilização (em crise) passa necessariamente pela constante valorização da música na educação de crianças e jovens.
E se há acertos no filme "Contatos Imediatos do 3º Grau", de Steven Spielberg, o principal deles é justamente a maneira com que se estabelece a comunicação dos humanos com os alienígenas. Aquelas já famosas 5 notas compostas por John Williams. Genial!


Sibelius por Bernstein

Já tenho 4 gravações da belíssima Quinta Sinfonia de Sibelius, duas em cd, uma em blu-ray e outra que "salvei" do YouTube, filmada em preto e branco, em 1966, sob a regência de Leonard Bernstein. Nela, a melhor de todas, apesar de "mono", o lendário maestro americano, com sua maneira emotiva e reverente de tratar a obra, não se limita a conduzir a orquestra na execução "correta" da música. Com um gestual que reflete profundo envolvimento com a sinfonia, ele vai mais longe, dando a impressão de "incorporar" o autor, transmitindo assim a verdadeira essência da obra. 
Enfim, assistir às performances de Bernstein é ter a oportunidade de conhecer as obras numa dimensão única e inconfundível que, talvez, só o compositor pudesse revelar.


Cinema, arte e indústria

É preciso reconhecer a competência com que os americanos tratam a indústria e a arte do cinema.
Hollywood já provou que produzir filmes costuma ser um ótimo negócio. É bem verdade que, às vezes, eles erram a mão e também perdem fortunas com equívocos monumentais como "Cleópatra", "O Portal do Paraíso" e tantos outros, mas o risco é inerente a qualquer negócio, principalmente aqueles que geram os maiores lucros.
Sabemos todos, porém, que, além de indústria, cinema também é arte e cultura.
Acabei de assistir ao extra do blu-ray de "Tubarão" que mostra o meticuloso, exaustivo e caro trabalho de restauração do filme, lançado no longínquo ano de 1975. Especialistas conseguiram recuperar a película a ponto de deixá-la mais nítida e com cores mais brilhantes do que foi possível perceber nos cópias exibidas há 43 anos, por ocasião do lançamento nos cinemas. Uma iniciativa que certamente gera um novo e lucrativo produto (dvd, blu-ray etc.), mas que também preserva por mais tempo um valioso patrimônio artístico e cultural para deleite e apreciação das futuras gerações. Com esse propósito, há inúmeras instituições nos EUA dedicadas ao trabalho de restauração de filmes e de partituras de trilhas sonoras que fizeram (ou escreveram) a bela história de Hollywood. Uma história que o mundo inteiro conhece e que se confunde com a própria história do cinema.


O "resgate"!

Os scores dos dois últimos filmes da franquia "Star Wars" nos devolvem o compositor John Williams do auge da carreira, justamente o período de lançamento do primeiro filme, o já clássico "Star Wars", de 1977.
Há nas duas trilhas sonoras arranjos complexos e eletrizantes para ricas melodias, com exploração exaustiva, me arrisco a dizer, da maioria dos naipes da orquestra. 
O fato é que ouvir seus trabalhos para os filmes mais recentes da saga é puro deleite para aqueles acostumados a apreciar a fascinante arte de compor de John Williams. Exatamente o meu caso, já que aprendi a apreciar música orquestral justamente com ele, que sempre se inspirou nas obras dos grandes mestres do passado, não só do cinema, mas também da música erudita. 
Não me surpreendeu, portanto, ouvir um trecho do score de "Star Wars - Os Últimos Jedi" claramente inspirado na Nona Sinfonia de Anton Bruckner, compositor austríaco de história de vida e talento singulares. Mas esse é um outro assunto.
A obra foi indicada ao Oscar desse ano, mas, como se trata de um score que se vale também de partes já compostas para produções anteriores, como é o caso do sempre presente tema principal da franquia, não teve qualquer chance. Mas valeria pela engenhosa e "orgânica" combinação de trechos antigos e novos realizada pelo compositor para criar mais um score brilhante.


Sonho e realidade

O filme "Um Sonho de Liberdade" aborda uma questão muito interessante, mas ao mesmo tempo trágica.
É possível um homem já idoso (de 70 anos), sem família e sem amigos, voltar a viver em sociedade após cumprir uma pena de prisão de 50 anos, em regime fechado?
Que referências (de qualquer ordem) ele pode ter para reconstruir a vida do lado de cá, já que não conhece nada nem ninguém? Tudo que ele sabe está no presídio onde viveu praticamente a vida inteira. Lá estão os amigos que têm e os valores que construiu. Em sociedade, embora livre, vai lhe faltar (quase) tudo!
Certamente, há situações na vida em que a liberdade pode se tornar uma verdadeira "maldição". Para um detento solitário e idoso que tenha cumprido uma pena de décadas, como o filme mostra, não passa de uma nova e cruel condenação.


Debate infantil

Considero uma irresponsabilidade fomentar e acirrar o clima de enfrentamento político em curso no Brasil, nas redes sociais ou por qualquer outro meio. Com isso, estamos à beira de um colapso do sistema de representação política no país, que pode ferir de morte o estado democrático de direito conquistado a duras penas pelos brasileiros nos últimos 30 anos.
Vejo gente supostamente de bem alimentando o sentimento de ódio entre lados diferentes (não necessariamente opostos) do espectro político, como se a prevalência de suas ideias fosse a panaceia para todos os problemas nacionais. Uma postura infantil e imatura por acreditar na possibilidade da construção de uma sociedade tão diversa como a brasileira desprezando os direitos das minorias ou dos adversários políticos. Parece que fazemos parte de um grande jardim de infância político, onde cada indivíduo apenas dá vazão aos próprios impulsos, sem o menor compromisso com o bem-estar coletivo ou com o futuro. Uma lástima!!


domingo, 6 de maio de 2018

Inesquecível primeiro amor

"O Primeiro Amor" (não confundir com "Meu Primeiro Amor", com Macaulay Culkin), é o melhor e mais simpático filme sobre "o primeiro amor" a que assisti em muitos anos. E a narrativa é bastante incomum, mostrando as cenas mais importantes sob o ponto de vista de cada um dos "pombinhos". Além disso, com um roteiro inspirado, o filme revela como uma sequência de encontros e desencontros acaba por forjar um desejo irresistível de aproximação e o inevitável amadurecimento do casal. Igualzinho à vida real!
Mais um belo filme de Rob Reiner (disponível no Netflix), o mesmo realizador do nostálgico "Conta Comigo", um clássico de 1986 que trata, com rara sensibilidade, do rito de passagem da adolescência para a vida adulta e de como determinados episódios da infância determinam o que (e como) seremos para o resto de nossas vidas.


Viver e deixar viver!

Quando vemos um jovem com dúvidas típicas da juventude (preferências, quem sou, o que vale a pena, o que quero da vida, onde quero chegar etc.), não temos muito o que dizer, afinal, não há mesmo respostas prontas para quase nada. Na verdade, para ser sincero (e dependendo do nível de presunção de cada um), estamos tão "perdidos" quanto eles. Vivemos o suficiente (ou não!) para saber que não há regras nem fórmulas matemáticas para viver plenamente, porque não há valores absolutos nem um caminho certo ou único para a realização ou para a felicidade. Cada um encontra o seu, do seu jeito e com seus próprios erros e acertos.
Alguém mais velho querer impor ao jovem o resultado de sua experiência de vida, com os mesmos receios e as mesmas escolhas, é pura falta de humildade e até mesmo de honestidade.
Pensei nisso assistindo ao ótimo filme espanhol "Viver é fácil com os olhos fechados", uma produção simples, mas que nos faz refletir sobre o respeito à individualidade.



"Antropoceno" ou a era da degradação

Acabei de assistir, no "History Channel", a "Como a terra fez o homem", um belíssimo documentário que explica como, ao longo de séculos e milênios, desde o início da civilização, a água, o fogo e o vento, elementos naturais, moldaram a ocupação do planeta pelo homem.
Hoje, na chamada "Era dos Humanos" (antropoceno), em nome do progresso e da produção de riquezas, o homem assume o comando do planeta, alterando o equilíbrio de seus elementos naturais com ações que provocam mudanças sobre as quais não tem controle. O que está em jogo é o futuro da civilização como a conhecemos e do próprio planeta.



Uma música, uma lembrança

A música do filme "Um Homem, Uma Mulher" (1966), composta por Francis Lai, é uma das que mais marcaram a minha infância, embora o filme não tenha nada de infantil. Ao ouvi-la, me transporto de imediato para o década de 1960 e para a Paris da arte, da cultura e do glamour da qual todos da minha geração cresceram ouvindo falar.
Aliás, pra mim, a década de 1960, com a contracultura, o pacifismo, a Nouvelle Vague, o Cinema Novo e os inflamados movimentos estudantis, marcou muito mais do que a década anterior, cantada em prosa e verso como uma década de ouro para a cultura ocidental. Talvez eu pense assim porque da década de 1950 só sei o que contaram. Já dos anos 60 trago as impressões mais remotas da minha vida, e essas, sabemos todos, ficam pra sempre na memória afetiva!


O oriente e o futuro dos concertos de música clássica

A exemplo do que ocorre com a indústria fonográfica, em especial com o ramo da música clássica ou erudita, também o universo dos concertos apresenta, em todo o mundo, inclusive na Europa, um franco declínio do público tradicional e nativo dos países que deram origem ao gênero.
Mas o consumo da música clássica vem se revigorando, pra mim surpreendentemente, com o crescente interesse dos orientais pelo gênero e pelas obras dos grandes mestres. China e Japão vêm, a cada ano, revelando ótimos intérpretes (ou solistas) que já se destacam nas temporadas das grandes orquestras europeias.
Além disso, por experiência própria, tenho observado um aumento substancial da afluência desse público nas salas de concerto, e mesmo nos eventos em museus e ao ar livre, em cidades como Paris, Berlim e Viena.
Boa parte do público presente na Konzerthaus de Viena, onde estive em junho passado, era formada por japoneses, ocupando, em sua maioria, os melhores e mais caros lugares da sala (plateia), uma prova inegável do prestígio que vêm dando a esses espetáculos. O próprio site oficial da Orquestra Filarmônica de Viena está disponível em alemão, inglês e...japonês, o que reflete a importância desse público para a sobrevivência das orquestras, mesmo as mais prestigiadas do mundo.
Enfim, o futuro (se houver) da música clássica como produto cultural pode depender da conquista e da consolidação do público oriental, evitando que tudo isso não passe de mera curiosidade ou modismo.
A propósito, a impressão que eu tive em minha visita a Viena é que metade dos turistas que circulavam pela cidade era formada por japoneses e chineses. Eles amam a Europa, até mais do que eu. E são muito mais bem-vindos porque gastam muito mais!




Em nome do "Mercado"

Para quem ainda se escandaliza ao saber do apoio de grandes empresas alemãs como BASF, Lufthansa, Siemens e Volkswagen, dentre outras, ao esforço de guerra do regime nazista, essa história de colaboração e cumplicidade entre os maiores estúdios de Hollywood (MGM, Warner Brothers, 20th Century-Fox, Universal etc.) e os nazistas, nos anos que antecederam o conflito, pode fazer corar de vergonha até o mais cínico de plantão.
Na defesa do mercado para os filmes americanos na Alemanha e no mundo, os executivos de Hollywood, em sua maioria judeus, se curvaram sistematicamente às exigências dos nazistas, alterando roteiros e suspendendo produções que não fossem do agrado de Hitler. Tudo isso antes mesmo do início das filmagens. Os nazistas chegaram ao cúmulo de impor uma lista de artistas, técnicos e roteiristas judeus ou simpatizantes que não poderiam, sob qualquer pretexto, participar de novas produções americanas. Caso os estúdios não se submetessem a isso, e os filmes fossem efetivamente realizados com a participação desses profissionais, a exibição da obra em qualquer lugar do mundo provocaria a suspensão imediata das atividades do estúdio responsável no território alemão.
Uma verdadeira infâmia, considerando as exigências estúpidas e o próprio conhecimento que a comunidade cinematográfica da época já tinha do regime ditatorial e antissemita que se instalara na Alemanha naqueles anos.




União sob risco

Após as duas grandes guerras ocorridas na primeira metade do século XX, que tiveram o continente europeu como palco principal, alguns países da região resolveram se unir para promover a recuperação de suas economias combalidas pelos conflitos. Em alguns anos, esse processo culminou na criação da União Europeia, que reúne hoje 28 países com interesses políticos e econômicos (nem sempre) comuns. Trata-se de um belo e ambicioso projeto destinado a aproximar os povos em defesa do bem-estar e da paz no continente. Na verdade, pelo forte simbolismo que encerra, o sucesso dessa experiência interessa a toda a humanidade.
Diante disso, como se inserem nesse projeto as reivindicações separatistas como o que estamos testemunhando na Catalunha nas últimas semanas? As lideranças nacionais da Europa de nosso tempo estão à altura do desafio de consolidar essa união? Por que surgem tantos políticos eurocéticos no continente? A atual crise de refugiados compromete o projeto? Existe chance real do estabelecimento de uma paz duradoura na Europa, à prova de crises econômicas, movimentos nacionalistas e líderes populistas? Enfim, para onde caminha a União Europeia?
Comprei esse livro na esperança de ter respostas para essas questões. Mas ainda está fila!


Tempos sombrios

O mundo anda cada vez mais dividido entre a obviedade e a estupidez. Não há nada além disso. Quando não nos vemos diante de uma ideia ou argumento medíocre, nos deparamos com atitudes estúpidas e insensatas, quando não violentas e profundamente desrespeitosas. Hoje, todo mundo quer aparecer (ou acontecer) de qualquer forma e a qualquer custo, mesmo que seja destratando ou agredindo os que parecem ou pensam de maneira diferente. E o exibicionismo e o desprezo são as palavras de ordem nas redes sociais, onde cada um se apresenta como a pessoa mais feliz do mundo e dono da verdade. Uma pobreza de espírito monumental!
Por outro lado, não aparece ninguém para sugerir ou fazer algo novo, criativo e que mexa com a mesmice que prevalece no mundo inteiro, não só no Brasil.
Enfim, há uma carência absoluta de iniciativas ou narrativas que mexam com as estruturas de uma civilização que precisa urgentemente se reinventar.


Impunidade ou crise de valores?

Refletindo sobre o noticiário diário no Brasil, recheado de casos de corrupção, descaso e negligência, principalmente com os mais pobres, como no episódio do incêndio e queda do edifício em São Paulo, pensei a respeito do que nos aflige há gerações.
Acredito que nossa crise permanente seja basicamente de valores. Valores que nos formem como Nação (isso mesmo, com N maiúsculo!). Valores que nos aproximem como cidadãos e que nos deem uma identidade que nos distinga do resto do mundo. Não necessariamente algo que nos torne melhores que os outros, mas apenas únicos e capazes de, com orgulho de nosso trajetória (passado), construir um futuro promissor.
Não defendo o patriotismo barato e oportunista ("o patriotismo é o último refúgio dos canalhas"!), mas a união do povo em torno de valores e destino comuns. Sem isso, somos um amontoado de gente (como gado), cada um defendendo apenas a sobrevivência e os próprios interesses, sem o menor sentido de comunidade ou Nação. No Brasil, infelizmente, é cada um por si e pelos seus e danem-se os outros. Se não é para mim ou para os "meus" (amigos, familiares etc.), não é da minha conta!
Não devemos nos enganar, essa é a mãe de todas as nossas mazelas!


Michael Jackson, uma história de sucesso?

Assisti ontem à noite, no YouTube, a alguns vídeos de Michael Jackson ainda jovem, criança mesmo, cantando "Music & Me", "I'll Be There", "Happy", "Go To Be There", "One Day in Your Life", "Ben" etc.
Meu Deus, o que a vida fez com aquele menino tão talentoso e ingênuo? Aparentemente tinha tudo para ser o mais feliz dos homens, mas parece que uma verdadeira maldição foi lançada sobre o rapaz, tornando sua vida uma mistura indigesta de sucessos e escândalos sem fim. Com o passar dos anos, o menininho que encantou o mundo com "Music & Me", "Ben" e "Happy" se transformou numa caricatura de si mesmo, recluso e insatisfeito com a própria aparência. Dotado, porém, de um talento monstruoso, resistiu a quase tudo e continuou fazendo sucesso, até falecer, em 2009, aos 50 anos, vítima de um coquetel de remédios ministrados criminosamente por seu médico particular.
Apesar de tudo que já foi dito, escrito e filmado sobre Michael Jackson, suspeito que sua triste história de vida ainda não tenha sido totalmente (ou devidamente) contada. E talvez não seja mesmo possível compreender toda a extensão da tragédia em que sua vida se transformou. Uma trajetória que sintetiza todo o mal que pode se abater sobre um ser humano, seja ele talentoso, rico, pobre ou medíocre. Um ser humano como qualquer um de nós.



Operação massacre!

O filme "Anthropoid" (2016), que assisti ontem à noite, mostra um dos episódios mais bárbaros e abomináveis de toda a II Guerra. 
Como represália ao assassinato de Reinhard Heydrich, segundo homem na hierarquia de comando das SS, em 10 de junho de 1942, os nazistas executaram todos os homens maiores de 16 anos moradores da pequena cidade de Lidice, próxima de Praga. Não satisfeito, o alto comando alemão ordenou que também as edificações fossem todas destruídas, apagando literalmente a cidade do mapa. 
No total, 1500 tchecos acabaram mortos covardemente por conta da morte do líder nazista, num dos maiores e mais monstruosos atos de vingança perpetrados contra civis em tempos de guerra. 
Uma verdadeira infâmia que desonra a própria natureza humana e que, portanto, jamais deverá ser esquecida, não só pelos tchecos, mas por toda a humanidade.
Quanto ao filme, se arrasta na primeira metade, mas recupera o "fôlego" no final. 


Uma Alemanha renegada

August Sander (1876-1964), um dos mais conceituados fotógrafos alemães do século XX, retratou, ainda no final dos anos 1920, uma Alemanha sem retoques ou censura, revelando a face real do povo, incluindo trabalhadores braçais, prostitutas, velhos e deficientes físicos, muitos alemães que, anos mais tarde, Hitler trataria como a escória da sociedade.
Claro, sua arte "degenerada" foi banida pelos nazistas, assim como muitos alemães que não correspondiam ao purismo ariano, mas resistiu à passagem dos anos como um legítimo testemunho de uma Alemanha real, diversa e humana, antes de ser corrompida pelos bárbaros ideais nazistas.




Muito barulho por nada

Acabei de assistir à "Mulher Maravilha" e confesso que não gostei. Desconfio que o cinema em geral, e Hollywood em particular, anda refletindo uma certa infantilização do público. 
É uma profusão de explosões, lutas intermináveis e efeitos especiais de última geração, à disposição de histórias maniqueístas e personagens "chapados", desprovidos de um mínimo de contradições ou complexidade. 
Tudo em nome do divertimento fácil.
É claro que sempre houve isso no cinema, mas receio que, nos últimos anos, esteja havendo um abuso desse fórmula puramente mercantilista por parte dos estúdios. O sintoma é justamente a recente exploração de filmes de super-heróis, que aumenta a cada ano.
Uma dose um pouco maior de arte (ou de profundidade temática) não faria mal à indústria!


Como cada um de nós

Passei os últimos dias (ou noites!) ouvindo as "integrais" de Beethoven e de Bruckner. Ao todo, 19 (9 + 10) sinfonias de compositores de personalidades tão díspares, mas que revelam os mesmos anseios e contradições humanas em busca da "verdade" e da transcendência. Exatamente como cada um de nós em nossas vidinhas ordinárias, mas cheias dos mesmos desejos, frustrações e necessidade de afirmação.



Música, fé e esperança

O livro "O Menestrel de Deus - Vida e Obra de Anton Bruckner" (cujo único pecado é não ser cronológico), de Lauro Machado Coelho, revela, em detalhes, a singular história de vida do controverso compositor austríaco, além de conter uma descrição crítica de suas obras mais importantes, incluindo as 3 últimas sinfonias e as 3 célebres missas. 
Ao contrário de outros grandes músicos que desde muito cedo tiveram consciência (ou convicção) de seu talento incomum, como Bach, Beethoven, Mozart, Mahler e Wagner, esse homem simples e provinciano passou boa parte da vida "implorando" por atenção e reconhecimento, embora tenha produzido obras monumentais tidas hoje como verdadeiras "catedrais sonoras", frutos de sua profunda devoção religiosa. 
Em Viena, para onde se mudou somente aos 44 anos, em 1868, Bruckner enfrentou o desprezo de colegas músicos e de críticos locais influentes, ainda que não lhe tenha faltado o apoio de muitos amigos, notadamente no final da vida, quando recebeu várias homenagens. Mas, na capital austríaca, detratores caçoavam do compositor por sua insegurança, postura servil e até mesmo pelo despojamento com que se vestia, pecado mortal numa Viena ainda imponente e imperial do século XIX. Submisso, não raras vezes, o compositor efetuou alterações significativas em suas composições supostamente já concluídas, visando agradar a críticos e músicos mais experientes e conceituados.
Apesar disso, passados mais de 122 anos de sua morte, a importância do legado de Bruckner é reconhecida por todos os amantes da "boa música", dentre compositores, intérpretes e público em geral. Suas obras, em especial as 3 missas e o "Te Deum", são impregnadas de sincera e intensa religiosidade e oferecem ao mundo um inegável testemunho de fé.
Em artigo publicado no site do "Correio de Atibaia", em novembro de 2017, o jornalista Marino Maradei Junior ofereceu um inspirado perfil do compositor: "...Feio, rude, atarracado, vestia-se tão mal que beirava o ridículo. Do amor feminino nada levou – a não ser desditas. Atropelou-o a cada passo a simplicidade quase infantil. Sua imensa candura jamais lhe abriu frestas nos olimpos cosmopolitas. Porém a sublimação mística o redimiu...".


O poder das palavras

O livro, obviamente, muito mais do que o filme, revela o inestimável poder das palavras, capazes de rivalizar com as armas mais letais quando se trata de mobilizar um povo em prol de um objetivo comum.
Nos momentos mais dramáticos do conflito, durante os quais as próprias lideranças britânicas já não tinham esperança de resistir à poderosa máquina de guerra nazista, Churchill, com discursos brilhantes no parlamento e na BBC, cala adversários políticos e recupera o orgulho nacional ferido. Foram passos decisivos para a reação (e a vitória) dos aliados e também para a construção de uma verdadeira lenda do século XX.


Um filme singular

"Reflexo do Mal" (Reflecting Skin), de 1990, dirigido por Philip Ridley e estrelado por Viggo Mortensen ("O Senhor dos Anéis") ainda em inicio de carreira, é um dos mais belos e originais filmes das últimas décadas, premiado em vários festivais de cinema. Um misto de drama, suspense e terror a serviço de uma história sombria sobre a maldade e a perda da inocência. 
Devido à temática excêntrica (fantasia gótica) e pouco comercial da produção, o filme nunca foi lançado no Brasil, em blu-ray, dvd ou mesmo VHS. Nos EUA, além do dvd, já está está à venda uma edição especial (limitada) em blu-ray, com vários extras e a opção de assistir apenas ao som da antológica trilha sonora composta por Nick Bicât. Para quem realmente gosta de cinema, e não apenas de entretenimento, um raro prazer, infelizmente indisponível para o público brasileiro.


Herança do mal

Esse livro (Filhos de Nazistas) revela como os filhos de líderes nazistas lidaram, ao longo da vida, com a herança maldita deixada pelos pais. Alguns se recusaram a acreditar nos relatos das atrocidades cometidas por aqueles que lhes deram a vida ou que lhes dedicaram tanto carinho e atenção durante a infância. Há outros que defenderam (e ainda defendem) as escolhas dos pais, dando continuidade, clandestinamente, ao movimento nazista.
Mas há também aqueles que rejeitaram essa herança e condenaram (e ainda condenam) com veemência os pais e seus atos criminosos.
Enfim, seja qual for a maneira como cada um escolheu para lidar com esse triste legado, trata-se de um fardo por demais pesado e cruel, se considerarmos que todos eram crianças ou muito jovens para entender a dimensão trágica daqueles acontecimentos. Um drama humano e familiar que dura uma vida inteira.


Gênio solitário

Você conhece Mozart e sua trajetória de vida? Se não leu esse "clássico" indispensável de Norbert Elias, eu diria que ignora o essencial sobre o compositor.
Mozart, assim como Van Gogh, foi um dos mais geniais "fracassados" da história da arte! Desde pequeno, viveu em função da música, como virtuose, compositor e "animador" das cortes europeias, mas, a despeito disso, morreu solitário, carente de amor e do reconhecimento social de sua genialidade. Uma triste história de vida para um homem eleito por Deus. Contraditório? Talvez, mas perfeitamente humano (e divino!).


Sonhos e pesadelos

Com o que sonhavam os alemães sob o jugo nazista?
Como um regime opressor e totalitário afeta a mente do homem comum, controlando seus sonhos (ou pesadelos) e relações pessoais?
Essas e outras questões são tratadas no livro "Sonhos no Terceiro Reich", de Charlote Beradt, que expõe a tortura psicológica promovida pelos nazistas logo após assumirem o poder e antes mesmo da deflagração da guerra. 
Uma abordagem curiosa e reveladora de como a mente humana processa as motivações do cotidiano e como isso determina nossas ações, quando oprimidos.




Vocação para a solidão

Nascemos com a vocação para a solidão, a mais absoluta solidão. O que somos, o que nos encanta, o que nos anima, o que nos aflige, enfim, tudo o que nos faz ser o que somos é algo impossível de compartilhar plenamente. Podemos ter mil relacionamentos, amores incontáveis e uma "multidão" de filhos e netos, mas ninguém, por mais tempo que nos acompanhe em nossa trajetória, será capaz de nos compreender por completo. Não há intimidade nem afeto que "resolva" isso. Não há amor, ainda que infinito, que dê conta disso. Nascemos sós, vivemos sós e morreremos sós.




Trilha sonora insuperável!

Não há adjetivos suficientes para qualificar essa obra-prima composta por Basil Poledouris para "Conan - O Bárbaro".
Talvez seja a mais bela trilha sonora já escrita para um filme de aventura em toda a história do cinema. Há passagens brilhantes no cd difíceis de destacar, contendo raras combinações de metais, percussão e cordas, além de pontuais e pungentes solos de trompa. É o tipo de inspiração que o artista tem uma única vez na carreira e que vale por uma vida inteira!
Entretanto, Poledouris, falecido em 2006, não gostou do resultado da gravação original do score, realizada com uma orquestra italiana de pequenas proporções. Para "corrigir" isso, o maestro Nic Raine reuniu coro e orquestra da Filarmônica de Praga, integrada por quase 100 músicos, para produzir uma gravação à altura da grandiosa obra-prima do compositor americano (de origem grega), considerada uma das mais bem-sucedidas do gênero. A gravação histórica deu origem a um cd duplo com o score completo (100 minutos), lançado em 2010 pela Prometheus Records e já raro no mercado. Na Amazon americana, por exemplo, é vendido por 99 dólares!


Histórias de todos nós!

Os três volumes já publicados de "Histórias da Gente Brasileira", de Mary del Priore, reúnem relatos raros e pitorescos sobre o cotidiano dos brasileiros comuns nos períodos de Colônia, Império e República (primeira parte), tema pouco abordado pelos historiadores, que sempre se ocuparam da vida palaciana e dos bastidores do poder.
As obras descrevem como trabalhavam, se alimentavam, se vestiam, se divertiam, enfim, hábitos e costumes da gente simples do país, incluindo os escravos nas senzalas.
São livros imprescindíveis para o conhecimento da formação do caráter do povo brasileiro e de como chegamos até aqui.
E a autora promete o lançamento de mais um volume sobre a República, tratando do período de 1950 até os nossos dias.




Rito de passagem

O filme "Sete Minutos depois da Meia-Noite", dirigido pelo espanhol J. A. Bayona, teve exibição relâmpago no circuito do Rio, no início do ano passado, e até hoje não foi lançado em mídia (dvd ou blu-ray) no Brasil. Finalmente, após exibição na Netflix, a produção estreia esse mês na tv por assinatura (HBO). 
O filme, elogiado pela crítica, trata de nossos sentimentos mais profundos e contraditórios, o quanto são naturais e a necessidade de admiti-los sem culpa ou cobrança. Trata, enfim, do rito de passagem ao qual todos estamos sujeitos até o último de nossos dias, jovens ou bem velhinhos no leito de morte. Portanto, é altamente recomendável, tanto para adultos como para jovens.


De pai pra filho!

Assistindo a um programa sobre Noel Rosa no canal "Arte1", me dei conta que meu falecido pai tinha Noel Rosa como ídolo. Ele lia tudo sobre o compositor, cujo trabalho certamente o inspirou nas centenas de sambas que compôs nos últimos 30 anos de vida. Sim, meu pai era compositor (integrava a ala dos compositores da Vila isabel) e dos bons. Escrevia música com enorme facilidade, sentado num bar, vendo televisão e até no meio da madrugada, quando lhe batia um ideia na cabeça. Infelizmente, tudo isso surgiu muito tarde na vida dele, somente quando veio morar em Vila Isabel, perto dos 60 anos.
O fato é que, se ele gostava de samba, eu gosto de música clássica; se Noel Rosa era o ídolo do Pepe, o meu é John Williams, compositor de trilhas sonoras.
Apesar das diferenças, no fundo, é tudo música. No final das contas, temos no sangue, e em comum, o mesmo amor pela música. 
A propósito, não há nada igual ao canal "Arte1" na televisão brasileira. Assisti ao programa de Noel Rosa logo depois de um especial sobre as sinfonias de Mahler. É arte e cultura sem preconceitos e sem fronteiras.


Impunidade ou crise de valores?

Por que "produzimos" tantos criminosos (e até assassinos!) nesse país? A cultura da impunidade explica tudo? 
Sei não, acho que vai além disso! Vivemos uma crise séria de valores civilizacionais, que se reflete no suborno ao guarda na esquina, no "atalho" do acostamento da estrada, na fila "furada", na bronca ao motorista que insiste em não parar fora do ponto, no troco a mais não devolvido e, claro, nos políticos já desmascarados que continuamos elegendo a cada escrutínio. Nem preciso dar nomes.
Nesse caldeirão cultural indigesto, a fronteira entre legal e ilegal, entre legítimo e ilegítimo, é perigosamente frágil. E pior, como nenhum de nós é uma ilha, cada um, diariamente, dá sua pequena (ou grande) contribuição para alimentar tudo isso.


Imigração e diversidade

Comprei esse livro em Madrid, em 2003, numa de minhas visitas aos primos espanhóis.
Na época, o movimento migratório em direção à Europa rica, procedente do leste europeu e também do norte da África e da América Latina, tinha a Espanha como um de seus principais destinos, por conta da excelente fase econômica que o país atravessava naquele período.
Eu mesmo, em minhas seguidas visitas à Espanha, fui testemunha do rápido enriquecimento do país nos anos de 1990 e 2000, interrompido com a crise de 2008, que afetou o mundo inteiro.
Esse livro aborda o fenômeno migratório e sua repercussão nas sociedades contemporâneas, descrevendo as dimensões política e econômica da imigração e os desafios sociais decorrentes da formação de sociedades caracterizadas cada vez mais por diversidade étnica e cultural. Claro, não falta também uma análise do papel da Espanha nos fluxos migratórios, antes como país emissor e mais recentemente como receptor, sob uma perspectiva histórica.
Uma bela análise que carece, por óbvio, de uma atualização, considerando que o problema migratório recrudesceu nos últimos anos, atingindo em maior grau a Ásia, o Oriente Médio e o próprio continente europeu. Até o Brasil vem tendo problemas com a chegada de levas cada vez maiores de imigrantes venezuelanos no estado de Roraima, um dos mais pobres da federação e que, por isso mesmo, necessita de apoio urgente do governo federal para enfrentar esse desafio.


A música do planeta


Os scores compostos por George Fenton para "Planeta Terra" e "Planeta Azul", documentários produzidos pela BBC, são testemunhos legítimos de como a música (ou a arte) pode verdadeiramente nos aproximar do Criador. 
O compositor inglês, responsável pelas trilhas sonoras de "As Loucuras do Rei George", "Ana e o Rei", "Ligações Perigosas", "Um Grito de Liberdade", "Memphis Belle - A Fortaleza Voadora", "A Companhia dos Lobos" etc., tem uma carreira de mais de 45 anos no cinema, mas acabou se consagrando mesmo com obras dedicadas a documentários para a televisão.
Fenton compôs trabalhos memoráveis para as séries "Planeta Azul" (2001), "Planeta Terra" (2006) e "Planeta Gelado" (2011), todos produzidos pela BBC.
Surpreendentemente (pra mim), a gravação do score para a versão cinematográfica de "Planeta Azul" foi realizada com a Orquestra Filarmônica de Berlim, sob a regência do próprio compositor. É fato raro a já mítica orquestra alemã participar de projetos desse tipo, o que torna a gravação uma verdadeira raridade. E a performance, claro, dispensa comentários.


"Nova" Civilização

Espero há décadas pela atualização dessa célebre série, apresentada por Kenneth Clark e produzida pela BBC, em 1969. O programa fez História e deixou saudade.
Filmada com câmeras de alta definição, a nova "Civilização", produzida para a inglesa BBC e para a PBS, emissora educativa americana, corre o mundo (31 países em 6 continentes) para mostrar, sob os pontos de vista de 3 historiadores de arte, nossa trajetória ao longo dos milênios e tudo o que nos torna únicos no planeta. 
Ainda não há data prevista para a estreia do programa. No Brasil, nem Deus sabe!




Do jeito alemão!

O conceito de tempo circular e não linear (como conhecemos) é o argumento básico da trama da série alemã "Dark" (Netflix), onde passado, presente e futuro ocorrem simultaneamente, permitindo uma série de paradoxos temporais.
Tudo isso muito bem narrado por roteiro, direção, performances, fotografia e desenho de produção ao nível das melhores produções americanas. Mas não espere encontrar algo parecido com o ritmo frenético das séries comuns do Netflix. Tudo ocorre, inclusive os diálogos, num tempo bem mais lento e contemplativo. Do jeito alemão!!


Um Coppola pessoal e renovado

"Tetro" (2009) passou quase despercebido nas salas de cinema do Rio. É um dos filmes mais pessoais de Francis Ford Coppola. Com bela e cuidada fotografia em preto e branco (caracteristica de suas produções), incluindo passagens em cores para as memórias do protagonista, o filme fala da função redentora da arte (aqui, uma peça de teatro) para um escritor frustrado e traumatizado pelo passado familiar, uma temática que lembra um pouco o consagrado romance "Desejo e Reparação", de Ian McEwan.
Belo filme, com ótimas interpretações, inclusive do jovem ator Alden Caleb Ehrenreich, que vem aí no papel de Han Solo, no filme "Han Solo: A Star Wars Story", com estreia prevista para esse mês, nos EUA.


Com amor, Van Gogh

Após consultar duas biografias de Van Gogh e assistir (e mais vez me emocionar) ao belíssimo filme "Com Amor, Van Gogh", sobre o pintor holandês, só posso chegar a uma conclusão. Mesmo depois de quase 130 anos, o mundo ainda não tem condições de esclarecer definitivamente a morte de Van Gogh. 
Foi mesmo suicídio, ou o artista teria sido vítima de um tiro intencional ou acidental disparado por um jovem desafeto da região?
O fato é que relatos diferentes e até contraditórios disponíveis na literatura atual não permitem que se chegue a uma versão confiável e conclusiva sobre os acontecimentos daquele fatídico dia 27 de julho de 1890, em Auvers, na França.
No fim do filme, que acabo de rever, em uma das inúmeras cartas enviadas ao irmão Théo, Van Gogh revela que queria ser lembrado como alguém que "sente profundamente; sente ternamente!". Saí do cinema em lágrimas e o mesmo se repetiu, agora, em casa.
Van Gogh foi uma alma sensível e atormentada que encontrou na arte a única forma de expressar suas angústias diante da vida. Enfim, é mais uma triste história de um artista incompreendido em seu tempo. E talvez até hoje!!


Um filme original e instigante.

Por conta da saber do falecimento recente do compositor islandês Jóhann Jóhannsson, responsável pela música de "A Chegada", acabei assistindo ao filme na HBO. Dirigida por Denis Villeneuve, a produção discute conceitos de linguagem (Sapir-Whorf - seu idioma determina sua forma de pensar) e de tempo (linear/não linear) como nenhum outro filme teve a ousadia de fazê-lo antes (talvez "Interestelar" tenha chegado perto!). E a mensagem pacifista, no final, é belíssima!
Como tenho o blu-ray do filme, assisti, também, a uma entrevista de 10 minutos com Jóhann Jóhannsson e fiquei impressionado com as ideias ousadas do compositor, que fez uma trilha extremamente original. Há pouco espaço ali para a melodia. É tudo bastante cerebral e abstrato. Um desafio e tanto que ele venceu brilhantemente.
Por fim, recomendo o filme para quem aprecia sair da "zona de conforto" dos filmes mais "comerciais". Descobri o trabalho (ou mais apropriadamente o universo) do diretor canadense Denis Villeneuve com "Incêndios", de 2010, um filme "perturbador" que nos faz perceber, com profundo desconforto ou constrangimento, a "verdadeira" natureza humana.


A Era da Mentira!

Entre o cinismo e a hipocrisia de muitos e o extremismo de outros tantos, é assim que vivemos perigosamente nesses tempos sombrios, no Brasil e no mundo.
A profunda crise moral e econômica que assola países e continentes, aliada às incertezas que produz, é terreno fértil para a desfaçatez como estratégia politica e também para o florescimento das ideias conservadoras que testemunhamos na mídia e na vida pública em geral. E não apenas no Brasil!
Ou seja, o mundo da "pós-verdade" ou dos "fatos alternativos" que emerge nas classes políticas parece se dividir, hoje, entre os calhordas oportunistas que mentem descaradamente e os estúpidos reacionários, cujos discursos moralistas encontram eco poderoso nas camadas menos esclarecidas e mais desassistidas da sociedade.