segunda-feira, 20 de outubro de 2014

O genial, o louco e o triunfo da arte



Aprecio música clássica há pelo menos 30 anos, e cada vez que ouço uma obra de Richard Wagner, como fiz ontem à noite assistindo ao concerto "The Ring without Words", síntese sinfônica extraída da tetralogia "O Anel do Nibelungo" pelo maestro Lorin Maazel, tenho a forte impressão de que, por mais que se reconheça e valorize o talento extraordinário de outros mestres (Bach, Mozart, Beethoven etc.), jamais houve um compositor tão genial como Richard Wagner. É um gigante da música que pode figurar, sem favor algum, ao lado dos maiores gênios da humanidade, como Leonardo da Vinci, Michelangelo e Einstein, tamanha a importância de seu legado, fonte inesgotável de prazer e inspiração para gerações seguidas de diletantes, músicos e compositores.
Curiosamente, o homem dotado dessa assombrosa genialidade demonstrou, ao longo de quase 70 anos de vida, ter tido um caráter comprovadamente deplorável. Antissemita, Wagner publicou diversos trabalhos criticando a influência judaica na sociedade alemã. Além disso, egoísta e oportunista, era capaz de fazer qualquer coisa para promover suas obras, não poupando nem os amigos mais próximos, incluindo o próprio rei Ludwig II, da Baviera. Conhecido como o "Rei Louco", Ludwig II idolatrava Wagner e, manipulado pelo compositor, contribuiu para arruinar as finanças do reino financiando seus projetos megalomaníacos, como, por exemplo, a construção do Teatro do Festival de Bayreuth, dedicado exclusivamente à encenação das óperas wagnerianas, evento anual que continua reunindo fãs ardorosos de Wagner espalhados pelo mundo.
Lamento apenas que, hoje em dia, não muitos se disponham a descobrir o universo maravilhoso que se descortina ao ouvir as extensas e complexas obras do compositor alemão. Elas certamente representam o triunfo da arte sobre as imperfeições humanas e a finitude da vida.


Montagem do "Anel do Nibelungo" no Metropolitan, em Nova York


Teatro de Bayreuth, na Baviera - Alemanha