domingo, 27 de janeiro de 2013

Uma visão do mundo perdida no tempo



Já faz algum tempo, assisti num festival de cinema da Caixa Cultural, no Centro do Rio, a uma verdadeira preciosidade da sétima arte, daquelas típicas dos saudosos cineclubes dos anos 60/70, infelizmente desaparecidos com o advento dos vídeos domésticos.
Trata-se do filme "Um Órfão nas Ruas", de Yan Gong e Ming Zhao, produção chinesa rodada em 1948, às vésperas da proclamação da República Popular da China. É uma obra singela, com notória motivação comunista, cuja cópia que assisti já se encontrava em precárias condições.
A história é francamente um pastiche, talvez inspirado em Dickens (Oliver Twist) e no neorrealismo italiano, mas nada disso compromete o prazer singular que oferece, por conter o registro histórico de uma visão do mundo, pueril e maniqueísta, já há muito perdida no tempo. 
Enfim, um raro prazer, não só pelas qualidades da obra, mas também pelas chances mínimas de revê-la.

domingo, 20 de janeiro de 2013

Fernando Velázquez, uma grata revelação


Fernando Velázquez, compositor espanhol de apenas 36 anos, já tinha me impressionado com o trabalho realizado para o filme "Lope" (2009), uma coprodução Brasil-Espanha dirigida pelo brasileiro Andrucha Waddington, sobre a vida do prolífico e polêmico poeta e dramaturgo Lope de Vega (1562-1635), um dos personagens mais interessantes da história da Espanha.
Responsável pela música do bem-sucedido "O Orfanato", dirigido um pouco antes, em 2007, pelo espanhol Juan Antônio Bayona, Fernando Velázquez vem recebendo justos elogios pela consistência de seus trabalhos, ao demonstrar pleno domínio da linguagem orquestral na construção da narrativa cinematográfica. 
Com "O Impossível", também dirigido por Bayona, o compositor conquistou definitivamente a minha admiração, escrevendo um belo e pungente score musical (vídeo abaixo), que alcança o clímax na sequência de reencontro casual da família, após longos dias de buscas infrutíferas pelo que restou da região atingida pelo tsunami.
Para mim, acostumado a apreciar compositores consagrados em Hollywood, desde ícones do passado como Max Steiner, Victor Young, Bernard Herrman, Franz Waxman e Miklos Rozsa, até contemporâneos como John Williams, James Newton Howard, Alan Silvestri e Howard Shore, é uma gratíssima revelação o surgimento desse jovem compositor espanhol, que certamente sinaliza com uma carreira promissora na indústria cinematográfica. 




quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Fazendo justiça à obra-prima de Basil Poledouris



Basil Poledouris, falecido em 2006, não gostou do resultado da gravação original de sua trilha sonora para o filme "Conan, o Bárbaro", de 1982, realizada com uma orquestra italiana de pequenas proporções. 
Para corrigir isso, em 2010, o maestro Nic Raine reuniu coro e orquestra da Filarmônica de Praga, integrada por quase 100 músicos, para produzir uma gravação à altura da grandiosa obra-prima do compositor americano (de origem grega), considerada uma das mais bem-sucedidas do gênero. 
O projeto deu origem a um cd duplo com o score completo de 100 minutos composto por Poledouris, lançado pela Prometheus Records e já raro no mercado (e que faz falta na minha coleção).



segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

O genial "Amadeus" também em alta definição


Produzir um filme sobre a vida de Wolfgang Amadeus Mozart, um dos maiores gênios musicais de todos os tempos, é um grande desafio para qualquer cineasta, certamente até para Milos Forman, premiado diretor tcheco, responsável por trabalhos aclamados como "Um Estranho no Ninho" e "Valmont".
Os roteiros de filmes desse tipo costumam recorrer a velhos clichês, dando ênfase às dificuldades, de ordem pessoal e profissional, enfrentadas pelo biografado ao longo da vida. No caso de Mozart, a tentação é ainda maior, considerando a morte prematura do músico, aos 35 anos, e a controvérsia a respeito de sua doença.
O competente Forman sabe que um bom filme pode perfeitamente conter clichês, desde que utilizados com a devida parcimônia. A doença de Mozart, seus crônicos problemas econômicos e os conflitos do artista com a esposa e o pai são recursos explorados com bom gosto e extrema sensibilidade pelo cineasta, que não se rende, em nenhum momento, ao sedutor apelo do dramalhão.
Mas as qualidades de "Amadeus", que recebeu os principais prêmios da indústria do cinema, em 1984, incluindo o Oscar e o Globo de Ouro de melhor filme, direção e ator (F. M. Abraham), não se restringem ao bom tratamento dado pelo diretor aos clichês cinematográficos. Milos Forman utiliza como mote a suposta rivalidade entre Mozart e Antônio Salieri, compositor da corte do imperador Joseph II, para nos contar uma deliciosa história de amor, fé, inveja, culpa e mistério, embalada pelas belíssimas músicas do compositor austríaco.
O filme, protagonizado pelo então estreante Tom Hulce e por F. Murray Abraham, nos papéis de Mozart e Salieri, respectivamente, encantou plateias do mundo inteiro, tornando conhecida do grande público a comovente história da vida do músico. 
Por tudo isso, esse foi um dos primeiros títulos que adquiri no formato blu-ray (alta definição), que inclui a versão definitiva do diretor e mais 20 minutos de cenas inéditas, além de extras reveladores sobre as dificuldades encontradas durante as filmagens, realizadas na cidade de Praga (República Tcheca), ainda sob o domínio soviético.
O trailer do filme (vídeo acima) é um dos mais criativos e eficazes já produzidos por Hollywood. Embora o tema tratado seja a vida de Mozart, o apelo lançado pelo trailer atinge um público que não se restringe aos apreciadores de música erudita.


quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

A perda de um "amigo" desconhecido



Curtindo o final das férias, e com o dia chuvoso convidando para ficar em casa, resolvi assistir hoje à tarde, mais uma vez, ao ótimo filme alemão "A Vida dos Outros " (Das Leben der Anderen), ganhador do Oscar de filme estrangeiro de 2007. A história mostra o processo de transformação vivido por um agente da Stasi, polícia secreta da Alemanha Oriental, em 1984, nos estertores do socialismo. Interpretado pelo excelente ator Ulrich Mühe, o policial resolve vigiar todos os passos de um casal formado por uma atriz e um autor teatral (Martina Gedeck e Sebastian Koch), embora ambos sejam considerados cidadãos acima de qualquer suspeita. Implacável defensor do sistema, o personagem vai aos poucos simpatizando com os investigados, a ponto de arriscar seriamente a missão e a própria carreira. Mais não conto para não estragar a surpresa da história para aqueles que ainda não assistiram.
O fato é que a cena final do filme, concluída com um close no rosto do personagem de Mühe, é simplesmente arrebatadora. Lembro muito bem que, ao assistir pela primeira vez, durante os créditos, acompanhados pela belíssima trilha sonora de Gabriel Yared, peguei o jornal para ler a coluna semanal do Arthur Dapieve, do Globo, que comentava sobre a produção e o elenco. Na ocasião, ainda sob o efeito da música de Yared, soltei um sonoro palavrão e fiquei arrasado ao saber que o ator havia falecido apenas alguns meses após a conclusão do filme. É como se estivesse recebendo a notícia da morte de um amigo pelo jornal.
Curioso como o cinema tem esse poder. Aliás, esse é o grande privilégio de atores/atrizes, que colecionam milhares (ou milhões!!) de "amigos" no mundo inteiro, quase todos, claro, completamente desconhecidos. Quando gostamos de um personagem e se estabelece essa poderosa empatia é como se ficássemos íntimos do artista, e a notícia de sua morte, em especial quando acabamos de ver o filme, só pode mesmo provocar essa estranha, mas legítima, sensação de perda. Para o bem ou para o mal, isso também faz parte da magia do cinema.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Marcel Ophuls e o mito da resistência francesa


Para quem se interessa por história, em especial da II Guerra, recomendo o documentário "A tristeza e a piedade", de Marcel Ophuls, produzido em 1969 e recentemente lançado no Brasil em dvd duplo, com alguns extras históricos, incluindo uma longa entrevista com o cineasta. 
A obra faz uma análise profunda, reveladora e sem paralelo do comportamento do povo francês durante a ocupação alemã na II Guerra. E não fica pedra sobre pedra de quase tudo que se diz a respeito da "heroica" resistência francesa no período. 
Realizado originalmente para as TVs da Alemanha e da Suíça, o filme, acusado por parte da sociedade francesa de ser uma obra antipatriótica, esperou longos 12 anos para ser transmitido pela TV do país.


sábado, 5 de janeiro de 2013

"O Milagre dos Nove Dias"



Acabei de rever o filme "Desejo e Reparação", de Joe Wright (o mesmo diretor de "Anna Karenina", que estreia em fevereiro no Brasil), adaptação bem-sucedida do belíssimo romance "Reparação", de Ian McEwan. E voltei a me emocionar com a triste, singular e surpreendente história de redenção da personagem Briony Tallis, em sua tentativa de reparar um terrível mal cometido aos 13 anos, com graves consequências para duas pessoas que amava.
Mais uma vez fiquei impressionado com a cena (ou plano-sequência) de apenas 5 minutos, sem cortes, que mostra o esforço desesperado dos aliados para retirar franceses e ingleses da praia de Dunquerque, na França. A cena do filme é, certamente, uma bela homenagem aos homens que escaparam do cerco dos alemães, no episódio da II Guerra Mundial que passou a ser conhecido como "O Milagre dos Nove Dias", curto período em que quase 400 mil soldados, entre os quais 150 mil franceses, lograram cruzar o Canal da Mancha, a maioria em condições precárias após intensos combates no litoral norte da França. Na ocasião, a fuga era a única alternativa para os soldados, que seriam facilmente dominados e mortos pelos alemães, tal a disparidade de forças na região e o estado de esgotamento e desespero em que se encontravam.
Após pesquisar na internet, descobri que essa retirada de combatentes, muitos gravemente feridos, acabou se constituindo numa estratégia vitoriosa, em razão da quantidade de vidas salvas. Até hoje, especula-se sobre o motivo pelo qual os alemães não chegaram a tempo para frustrar a operação.
Certamente, a beleza da sequência no filme tem muito a ver com o simbolismo daqueles acontecimentos, tratados pelo diretor com a devida reverência e profunda sensibilidade. Talvez inspirado por tudo isso, também o compositor Dario Marianelli (parceiro do diretor em "Orgulho e Preconceito" e mais recentemente em "Anna Karenina") nos brinda com uma música comovente para a cena, a qual funciona como uma verdadeira elegia aos homens que participaram daquele episódio. 

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

"Anna Karenina": nova adaptação para o cinema estreia em março no Brasil

A mais nova adaptação de "Anna Karenina", obra-prima do escritor russo Leo Tolstoi, tem estreia prevista para 15 de março nos cinemas brasileiros. 
Dirigido pelo inglês Joe Wright, o mesmo de "Orgulho e Preconceito" e "Desejo e Reparação", e protagonizado por Keira Knightley, Jude Law e Aaron Taylor-Johnson (no papel do jovem amante), o filme, como seria previsível, apresenta suntuosa reconstituição de época (séc. XVIII), mas não parece ir muito além disso. 
A julgar pela carreira da produção no exterior (esnobada pelo Globo de Ouro e pelo Oscar, onde ganhou apenas na categoria figurino), somente a trilha sonora, composta pelo italiano Dario Marianelli, é digna de destaque, por enfatizar muito bem a atmosfera aristocrática da história, sem, contudo, desprezar a força dramática e intimista contida na trama e, claro, no próprio romance (desafio às rígidas convenções sociais, amor "impossível", traição etc).
O visual deslumbrante do filme pode ser conferido no trailer abaixo:


quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

"O Impossível", um drama contundente e bem realizado (mas desaconselhável para os mais sensíveis)

Assisti no cinema hoje à tarde ao filme "O Impossível", que mostra a destruição provocada pelo tsunami que atingiu a costa da Tailândia em dezembro de 2004, sob o ponto de vista de integrantes de uma família inglesa vítima da tragédia. 
O filme, baseado na experiência real vivida por uma família espanhola (casal e três meninos), é um drama contundente que não poupa o espectador de momentos de profunda angústia e tensão, por mostrar o sofrimento físico e emocional infligido a uma família comum diante de um desastre de grandes proporções. 
Dirigida pelo espanhol Juan Antonio Bayona e estrelada por Naomi Watts e Ewan McGregor, a produção é artística e tecnicamente bem realizada, mas não recomendada aos mais sensíveis, por conter cenas de forte impacto emocional envolvendo crianças.  
O vídeo abaixo apresenta imagens da gravação da bonita e pungente trilha sonora composta pelo jovem Fernando Velázquez (36 anos) para a produção, mescladas com fotos do filme. 


A seguir, o trailer oficial do filme.


Entrevista com Tom Holland, jovem ator de 14 anos que fez o papel de Lucas, filho mais velho do casal interpretado por Naomi Watts/Ewan McGregor e verdadeiro protagonista do filme.


E aqui, um vídeo que mostra a criação do tsunami com o auxílio dos efeitos especiais. Parece simples, mas funcionou perfeitamente no filme.


"Lassie" (2005), a magia da música no cinema



Essa é apenas mais uma das "trocentas" versões de Lassie para o cinema, mas a trilha sonora composta por Adrian Johnston é belíssima. Se há músicas que conferem qualidade e nobreza a um filme, aqui está um exemplo clássico. No vídeo acima, 59 segundos que sintetizam perfeitamente a magia da música no cinema.

"Coração de Dragão", a obra-prima de Randy Edelman


Com a cidade de ressaca e o dia completamente livre, aproveitei esse feriado de 1º de janeiro para ouvir música, em especial trilhas sonoras de cinema. Entre tantos cds de minha extensa coleção (aprox. 600), escolhi obras de compositores menos consagrados, tentando encontrar algo já esquecido e que me surpreendesse novamente nesse universo maravilhoso que é a música para filmes.
Como recompensa, após um exaustivo exercício de garimpagem, resgatei do fundo do baú a bela trilha sonora de "Coração de Dragão" (1996), que acabei ouvindo várias vezes.
É curioso como alguns compositores apenas medianos surgem, às vezes, com trabalhos encantadores e convincentes, capazes até de nos fazer suspeitar de sua real autoria (que maldade!). Na verdade, a composição está longe de ser perfeita ou genial. Trata-se basicamente de variações sobre poucos temas, como costuma ocorrer no cinema, mas podemos considerá-la a obra-prima de Randy Edelman, figurando, sem favor algum, entre as melhores trilhas sonoras dos últimos vinte anos. Destaco o alto grau de lirismo de suas melodias, que é arrebatador e nos remete imediatamente à infância, ou pelo menos a um período de nossas vidas em que ainda nos permitíamos todas as ilusões.
Uma pequena amostra pode ser conferida no vídeo abaixo.