segunda-feira, 18 de julho de 2022

Kurt Masur e a lição de uma vida!


Se vivo fosse, Kurt Masur completaria hoje 95 anos!
Em 21 de junho de 2008, tive a oportunidade (e a sorte) de assistir a um concerto com a Orquestra Nacional da França, sob a regência do saudoso maestro alemão, no Museu D'Orsay, em Paris.
No documentário "Uma Aventura Musical" que tenho em meu acervo, Masur conta um episódio peculiar do início de carreira que reflete perfeitamente o quanto podemos perder (ou deixar de ganhar) quando nos deixamos levar pelo orgulho e pela vaidade. E o que vale para a música certamente se aplica a todas as dimensões da vida.
No dia seguinte a um concerto no qual, ainda muito jovem, regeu pela primeira vez uma sinfonia de Bruckner, o maestro encontrou na rua um famoso professor de violino que lhe disse:
- Seu concerto ontem foi bom, mas teria sido melhor se você, durante a performance, demonstrasse amar mais a Bruckner do que a si próprio.
Masur afirmou que essa "lição" de humildade teria pautado suas decisões ao longo de toda a carreira, determinando a relação que passaria a ter dali por diante com a música.
Quando o músico, e não só o maestro, se dispõe a "compreender" o compositor, suas motivações e até mesmo as possíveis inquietações que o levaram a criar a obra, aí sim se estabelece a cumplicidade necessária para reproduzir mais fielmente suas ideias, justamente o que testemunhei naquele inesquecível concerto do verão de 2008, em Paris.


domingo, 17 de julho de 2022

Semelhanças, diferenças e a humanidade que nos define!



"É melhor presenciar algo uma única vez do que ouvir sobre isso milhares de vezes" - Provérbio asiático.

Nesses tempos de inflação alta na Europa e no mundo, e de dólar/euro cada vez mais caro, não custa fazer uma retrospectiva de um tempo em que era mais fácil (e barato) cruzar fronteiras.
Por pura sorte (e talvez oportunidade histórica), comecei a viajar justamente quando o real valia muito. Na primeira viagem, em 1995, nossa nova moeda valia mais do que o dólar ou qualquer moeda europeia. Naquela época pré-euro, até a Europa era acessível para os brasileiros. Nos últimos anos, porém, com a crise econômica, o aumento do dólar/euro e a pandemia da Covid-19, o cenário mudou.
Tenho plena consciência de que aproveitei muito bem os melhores anos da economia brasileira para realizar um sonho de infância, conhecer a Europa, experimentando algumas das maiores emoções que tive na vida. Atravessei o continente de um jeito que mesmos os turistas endinheirados (que não é e nunca foi o meu caso!) não têm a oportunidade de fazer.
- De trem, de carro e até de bicicleta, visitei cidades grandes e pequenas e dezenas de aldeias no interior de vários países, incluindo algumas que nunca tinham recebido um brasileiro;
- Em 1995, para retornar ao Brasil, fiz uma viagem de trem de Stuttgart a Lisboa, com duas conexões (Paris e Irun), que levou nada menos que 32 horas. Era a primeira viagem e aprendi a lição sobre bilhetes aéreos;
- Na primeira vez que cheguei em Paris, também em 1995 (sem internet), me vi, com mala e cuia, sem hospedagem na cidade. Meu inglês iniciante é que me salvou de dormir na estação de trem;
- Fui o primeiro brasileiro da família a encontrar os primos espanhóis, em Barcelona e na Galícia, após mais de 60 anos, iniciativa da qual vou me orgulhar pelo resto da vida;
- Me perdi de carro na Croácia e só "me achei" com a ajuda providencial de peladeiros de beira de estrada;
- Cheguei de carro a Vaduz, capital de Liechtenstein, sem saber que estava no país, uma experiência única da qual jamais esquecerei;
- Com 56 anos, fui à praia (ou pelo menos à beira da água!) na Bósnia e Herzegovina. Para um carioca que não vai à praia no Rio desde criança, um evento pra lá de singular;
- Testemunhei a realização de uma Copa do Mundo no país-sede, Alemanha, incluindo a abertura do evento numa Munique ensolarada, festiva e tomada por torcedores de várias nacionalidades. Vivi ali alguns dos momentos mais felizes da minha vida;
- Viajei num ônibus "exclusivo" de Viena a Praga (mais de 6 horas!) ao custo de apenas 3 garrafinhas de água, com direito a suspense e receio com a imigração tcheca na fronteira com a Áustria;
- Por 4 vezes, na Alemanha e na Áustria, me vi sem hospedagem perto do anoitecer. Numa delas, fui salvo por D. Érika, uma simpática senhora austríaca que me "abrigou" em sua casa de Nenzing, uma pequena cidade nos alpes austríacos;
- Na semana que antecedeu a abertura da Copa da Alemanha, em 2006, peguei uma carona de Praga a Frankfurt num ônibus escolar, gentilmente oferecida pelos alunos do meu amigo alemão.
E muito, muito mais histórias que dariam até para escrever um livro!
Vale dizer que, em algumas dessas viagens, eu estava acompanhado de amigos alemães e brasileiros, o que tornou essas experiências ainda mais divertidas.
Com tudo isso, pensar que muito jovem, antes mesmo de sair do Rio pela primeira vez (para Ouro Preto), eu acalentava o sonho de apenas "pisar" na Europa. Nem pensava no que faria depois, eu só me imaginava colocando os pés no velho continente!
Ainda criança (com pouco mais de 10 anos), lembro-me perfeitamente de como ficava ansioso por folhear cada fascículo da coleção "Geografia Ilustrada" que minha mãe comprava nas bancas de jornais. Quanto mais distante (e diferente) o país, maior a minha curiosidade. Como eram, como viviam, o que pensavam?
Depois de tantas viagens, não tenho todas as respostas, mas pude descobrir que as semelhanças entre os povos são muito maiores e eloquentes do que as diferenças que os distinguem. Uma lição que nenhum livro e só mesmo as viagens poderiam me proporcionar!


quarta-feira, 6 de julho de 2022

Memórias do cinema...

Minha primeira relação com o cinema foi de "ódio à primeira vista"!
A empregada lá de casa pediu e minha mãe concordou que ela levasse as crianças (meus irmãos e eu) para assistir "A Noviça Rebelde". Eu tinha apenas 6 anos e não entendi absolutamente nada daquela "história sem fim" sobre uma família rica e numerosa que gostava de música e vivia num lugar bonito e distante. Música folclórica austríaca, nazismo e perseguição política (embora vivêssemos aqui numa ditadura) eram temas alheios à minha realidade. Depois de três horas sentado numa sala escura e sem poder falar ou levantar, eu aprendi, na mais tenra idade, o verdadeiro significado de tortura.
Com o trauma do primeiro "encontro", o cinema só viria a me conquistar muitos anos mais tarde quando, já adolescente, assisti a "Houve Uma Vez Um Verão", de Robert Mulligan.
A história nostálgica de um rapaz da minha idade apaixonado por uma mulher madura e comprometida, um belo rito de passagem, mexeu comigo como poucas que vi no cinema em toda a minha vida, o que contribuiu para que eu ingressasse no curso de Cinema da UFF. O objetivo era me tornar roteirista, mas tranquei a matrícula assim que passei no concurso do IBGE. O serviço público, do qual fiz parte por 35 anos e me orgulho muito, abortou minha carreira no cinema antes mesmo de começar.
O fato é que não demorou para que eu trocasse a PAIXÃO pelo cinema pelo AMOR pela música. Ainda hoje, adoro assistir a filmes, mas a música se tornou um vício e uma razão de viver, que se traduz por uma busca incessante pela Beleza, pelo Amor e pela Verdade. Estou convencido de que nenhuma outra manifestação humana nos aproxima tanto disso!