sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O Clássico dos clássicos também em alta definição!



Poucos filmes povoaram tanto o imaginário popular no século XX como "E o Vento Levou", agora também disponível em alta definição (blu-ray). Baseado no romance homônimo de Margaret Mitchell, que vendeu, em 1936, mais de 1 milhão de exemplares em apenas 4 meses (um fenômeno de vendas ainda hoje), o filme da MGM, lançado em 1939, retrata a saga de uma rica família de imigrantes irlandeses na Geórgia, no período da guerra civil americana. 
O lendário produtor David O. Selznick não poupou recursos e investiu mais de 5 milhões de dólares, uma verdadeira fortuna para os padrões da época, transformando a produção num evento sem precedentes para a jovem indústria cinematográfica de Hollywood. 
A escolha da inglesa Vivien Leigh para o papel de Scarlett O'Hara, que só ocorreu após o início das fimagens, envolveu uma acirrada disputa, da qual participaram mais de 1400 atrizes, algumas delas já consagradas como Bette Davis, Joan Crawford e Paulette Godard.
Max Steiner, compositor austríaco de sólida formação erudita, responsável pelas músicas de "Casablanca", "King Kong" (1933) e "Nasce Uma Estrela", dentre outras, compôs para "E o Vento Levou" uma trilha sonora verdadeiramente antológica, que se tornaria o mais importante ícone da música para o cinema, em todo o século XX. 
A direção do filme foi creditada a Victor Fleming, mas contou com a participação de pelo menos mais 4 diretores, que não aparecem nos créditos. Do mesmo modo, o roteiro, apesar de oficialmente atribuído apenas a Sidney Howard, teve a colaboração dos escritores F. Scott Fitzgerald e William Faulkner, e da própria autora do romance, Margaret Mitchell.
Embora tenha adquirido o status de clássico, justamente pelos padrões de excelência que estabeleceu na indústria, "E o Vento Levou", como boa parte dos filmes da época de ouro de Hollywood, perdeu um pouco de seu encanto com o passar do tempo. Recheado de clichês já exaustivamente explorados por produções posteriores, o filme não dispõe hoje do mesmo poder de sedução e encantamento que exerceu sobre o público do passado. Inegavelmente, porém, por tudo que representa para a história do cinema, "E o Vento Levou" ocupa lugar de destaque na galeria dos maiores filmes de todos os tempos.  

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Jerry Goldsmith e o clímax no cinema


Já citei Jerry Goldsmith aqui algumas vezes, mas não me canso de destacar a genialidade de um compositor de trilhas sonoras que foi responsável, ao lado de John Williams, por muitos momentos inesquecíveis que o cinema me proporcionou em tantos anos. 
O fato é que Goldsmith, falecido em 2004, dominava como poucos (ou pouquíssimos) a arte de valorizar, com música, os momentos mais dramáticos de uma história, como podemos constatar no vídeo abaixo, que mostra a cena final do filme "Momentos Decisivos" (1986). 
É um belo exemplo da valiosa contribuição da trilha sonora para o enriquecimento da narrativa cinematográfica.


domingo, 16 de dezembro de 2012

"Conta Comigo" - Um filme que já nasceu clássico

Poucos filmes marcaram tanto a minha vida quanto "Conta Comigo" (1986), dirigido por Rob Reiner. É certamente uma das melhores adaptações de obras de Stephen King para o cinema, inclusive na opinião do próprio escritor, conforme relata nos extras do blu-ray.
Em todos esses anos, já assisti ao filme várias vezes, sempre com prazer renovado. Apesar de mostrar a aventura de quatro moleques do interior dos EUA no final da década de 50, o tema tratado é universal e atemporal. Que homem, de qualquer geração, não integrou na infância ou adolescência um grupo daquele, formado basicamente por um mais inteligente, um ingênuo, um valentão, e um mais paternal e responsável? É curioso como, em qualquer cultura, vamos encontrar essa mesma combinação, com leves variações de temperamento e quantidade. 
Realizado com poucos recursos, o filme acabou marcando época. Algumas locações nas cidades de Eugene e Brownsville (Oregon) são conservadas até hoje como atrações turísticas para os fãs da produção. Dos quatro jovens atores protagonistas (Will Wheaton, Corey Feldman, Jerry O' Connel e River Phoenix), o mais talentoso e que parecia ter a carreira mais promissora - River Phoenix - acabou falecendo muito cedo, aos 23 anos, vítima de overdose de drogas. Ironicamente, seu personagem é também o único dos quatro que morre na história, fato revelado numa das cenas mais comoventes do filme, já no final.


sábado, 15 de dezembro de 2012

"O Segredo dos seus Olhos" e o vigor do cinema argentino


É curioso como alguns filmes aparentemente simples têm a capacidade de atingir o patamar de verdadeiras obras de arte.
É o caso de "O Segredo dos Seus Olhos", filme argentino vencedor do Oscar em 2010. É uma produção singular, que percorre gêneros variados (político, suspense, drama, romance etc) sem perder, por um instante sequer, o vigor e a coerência narrativa. Tudo isso para contar uma belíssima história sobre a natureza humana e os sentimentos que nos movem, para o bem ou para o mal, em nossas relações.
Destaco a performance do elenco, em especial do aclamado ator Ricardo Darín, unanimidade na Argentina e no Brasil, e a sentida música de Federico Jusid, que pontua o filme com delicadeza e perfeição. Confiram no vídeo.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Shyamalan e J. Newton Howard: uma parceria curiosa


É no mínimo curiosa a química envolvendo a longa parceria do cineasta M. Night Shyamalan ("O Sexto Sentido", "Corpo Fechado", "Sinais", "A Vila", "A Dama na Água", "O Último Mestre do Ar" etc.) com o compositor James Newton Howard. Os piores filmes de Shyamalan renderam os melhores trabalhos de toda a carreira de Howard, como aconteceu com "A Dama na Água" e "O Último Mestre do Ar". É assim que eles se entendem (ou não), fazer o quê?
O vídeo abaixo contém a faixa que encerra o cd de "Último Mestre do Ar", uma síntese do belo score composto por James Newton Howard para o filme.




domingo, 9 de dezembro de 2012

Ludwig II: vida e morte de um rei que virou lenda



Estreia no próximo dia 26 de dezembro, na Alemanha, a superprodução "Ludwig II", sobre um dos personagens mais apaixonantes e controvertidos da história alemã.
Conhecido como o "Rei Louco", Ludwig II teria levado o Reino da Baviera à ruína com a construção de suntuosos castelos e o patrocínio de projetos megalomaníacos de Richard Wagner, incluindo montagens monumentais das óperas do compositor e a edificação de um teatro em Bayreuth destinado exclusivamente à representação de suas obras.
Ludwig II morreu em 13 de junho de 1886, dois meses antes de completar 41 anos, em circunstâncias misteriosas nunca completamente esclarecidas. Seu corpo e o de seu médico particular (Dr. Gudden) foram encontrados já sem vida no Lago Starnberg. A versão oficial de suicídio vem sendo contestada até hoje, considerando a morte do médico no mesmo episódio (um pacto de morte?) e o fato de que o rei nadava muito bem.
O mais famoso rei da Baviera já tinha sido retratado brilhantemente pelo cineasta italiano Luchino Visconti, em produção antológica de 1972, estrelada por Helmut Berger no papel do monarca e Romy Schneider como Elizabeth, prima de Ludwig e futura imperatriz da Áustria. O maior risco (artístico e comercial) para esse novo filme é exatamente sofrer comparações com um clássico do cinema que já tratou do mesmo tema com maestria.
De minha parte, aguardo com grande expectativa a estreia do filme no Brasil, tendo em vista meu profundo interesse por tudo que diga respeito à Alemanha e, em particular, à Baviera, uma região de beleza incomparável e com história peculiar, que sempre esteve do lado errado nas guerras, antes mesmo de integrar o moderno Estado Alemão, formado no final do século XIX.
Assista abaixo ao trailer do filme, com imagens impressionantes em alta definição (site oficial: http://wwws.warnerbros.de/ludwigii/):


sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

"O Romance do Século"



A crítica arrasou "W.E. - O Romance do Século" (2011), dirigido por Madonna, mas a produção teve pelo menos um grande mérito. Proporcionou a Abel Korzeniowski a oportunidade de compor um dos scores mais bonitos do cinema nos últimos anos.
Por vezes minimalista, lembrando o melhor de Michael Nyman e Philip Glass, o compositor polonês explorou com maestria a atmosfera romântica do filme, cujo roteiro é inspirado no polêmico caso de amor que sacudiu a Inglaterra em 1936, entre Eduardo VIII, sucessor da coroa britânica, e a plebeia americana Wallis Simpson.
Minha amiga Mari Blue, talentosíssima cantora da nova geração, recomenda o cd: - já ouvi mil vezes, é lindo!!
A suíte contida no vídeo acima dá uma boa ideia do belo trabalho de Abel Korzeniowski, que já havia impressionado com sua música para o filme "Direito de Amar", de 2009.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

"Os Três Mosqueteiros" e a infantilização do cinema


Na era dos efeitos especiais digitais, a exuberância visual dos filmes tem se mostrado inversamente proporcional à qualidade dos roteiros, em especial dos diálogos, cada vez mais infantilizados.
É o caso da mais nova versão de "Os Três Mosqueteiros" (2011), que assisti neste fim de semana na NET. Por meio de recursos digitais de última geração, a reconstituição de época oferece imagens belíssimas da Paris do século XVII, proporcionando ao espectador uma encantadora viagem no tempo. Já os diálogos, pobres “de marré deci”, chegam a ser constrangedores pela tentativa malsucedida de fazer graça a toda hora em situações totalmente inverossímeis. 
O fato de ser um filme apenas para divertir, sem maiores pretensões de conteúdo, não justifica tamanho desprezo pelo roteiro.


domingo, 2 de dezembro de 2012

A obra-prima de Victor Young



Acabei de ouvir e não posso deixar de registrar que este cd contém uma rara gravação de uma das mais belas e comoventes partituras escritas para o cinema, em todos os tempos. Se "Shane" (1953) já se tornou um clássico indiscutível, o mesmo podemos dizer a respeito de sua música.
A trilha sonora composta por Victor Young para o filme (que, no Brasil, recebeu o infeliz título de "Os Brutos também Amam") pode figurar, sem favor algum, entre os memoráveis trabalhos, dele e de outros mestres, que contribuíram para conferir a esse gênero musical o status de arte. Ainda hoje, após quase 60 anos do lançamento do filme, uma obra simplesmente irresistível (vídeo abaixo).


Chaplin, Tchaikovsky e Van Gogh

Mais uma obra indispensável chega às livrarias neste fim de ano. "Van Gogh - A Vida" (Companhia das Letras), escrita por Steven Naifeh e Gregory White Smith, após pesquisa inédita e exaustiva a respeito da vida do artista holandês, incluindo mais de 1.000 cartas, já está sendo considerada pelos estudiosos como a mais completa biografia publicada sobre Van Gogh.
Com mais de 1.100 páginas (incluindo um caderno de fotos), o livro revela, em detalhes, a curta história de vida do pintor pós-impressionista, falecido aos 37 anos, abordando aspectos de seu relacionamento com família, amigos, mulheres e religião, e defendendo uma nova tese, no mínimo controvertida, sobre sua morte. Contrariando a versão de suicídio difundida há décadas, os autores afirmam (ou sugerem) que o artista, na verdade, teria sido morto por um adolescente de 16 anos (René Secrétan), com o qual vivia se desentendendo nas ruas.
Certamente, ao lado de "Chaplin - Uma Biografia Definitiva", de David Robinson, que conta a vida do genial cineasta responsável por Carlitos, e de "Piotr Tchaikovsky", extensa biografia escrita por Alexander Poznansky sobre o aclamado compositor russo, "Van Gogh - A Vida" se insere, com louvor, entre os melhores lançamentos do mercado editorial brasileiro nos últimos meses. Para quem aprecia esse tipo de literatura (e/ou os artistas), eis ótimos presentes de Natal.


                                                                                        

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Os metais, o belo e o épico no cinema




Tradicionalmente, o gênero de música que tira melhor proveito da variedade tímbrica da trompa é o score de filmes. E no caso particular das trilhas sonoras de faroestes, o som aveludado produzido pelo conjunto de trompas da orquestra, que pode ir do doce e melancólico ao solene e grandioso, com o auxílio dos outros metais (trompete, trombone e tuba), contribui para conferir às narrativas uma atmosfera épica que se tornou marca registrada dos maiores clássicos do gênero.
Na música composta para "Silverado" (vídeo acima), filme que está longe de ser um clássico, Bruce Broughton explora a sonoridade típica da família dos metais para produzir um de seus mais belos e consagrados trabalhos para o cinema, numa digna homenagem aos grandes compositores do passado, como Dimitri Tiomkin, Victor Young, Elmer Bernstein e Max Steiner.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Um filme singular, sombrio e nada comercial

"Reflexo do Mal" (1990), de Philip Ridley, estrelado por Viggo Mortensen ("O Senhor dos Anéis") ainda em inicio de carreira, é um filme realmente singular. Não consigo associá-lo a nada que já tenha assistido. Um misto de drama, suspense e terror a serviço de uma história sombria sobre a maldade e a perda da inocência. 
Devido à temática excêntrica e pouco comercial da produção, o filme só foi lançado em dvd no ano passado (EUA, Japão e Alemanha), embora tenha colecionado prêmios em vários festivais de cinema. 



segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Dudamel e a 8ª Sinfonia de Mahler: não sabendo que era impossível, foi lá e fez!!

Dias atrás, publiquei um comentário sobre a grandiosidade da 8ª Sinfonia de Gustav Mahler, a "Sinfonia dos Mil", assim chamada por requerer, idealizadamente, em torno de 1000 intérpretes para sua execução, entre músicos, solistas e coros.
O vídeo abaixo promove o blu-ray/dvd com a gravação realizada em fevereiro deste ano, em Caracas, quando o jovem regente venezuelano Gustavo Dudamel, atual queridinho da crítica, superou todas as expectativas (e talvez os limites do bom senso), reunindo nada menos do que 1400 artistas para executar a obra, entre músicos (Orquestra Filarmônica de Los Angeles e Orquestra Sinfônica Simon Bolivar), 8 solistas e coros com mais de 1000 vozes, incluindo 400 crianças, todas elas cantando de memória, o que pode representar um desafio maior para o condutor. Dá pra imaginar os ensaios com essa gente toda?
Não sei se ficou bom porque ainda não vi/ouvi (comprei o dvd agora), mas acho que a ousadia de Dudamel superou todos os limites. Ou talvez esse seja um projeto para lembrar e corroborar aquele velho pensamento atribuído ao francês Jean Cocteau:
- não sabendo que era impossível, foi lá e fez!


domingo, 18 de novembro de 2012

Os alemães são mais flexíveis?

Theatro Municipal do Rio de Janeiro

Como já contei aqui, em junho de 2010 visitei a mundialmente famosa sede da mítica Orquestra Filarmônica de Berlim. Vestido como um típico turista, de bermuda, camisa da seleção brasileira, tênis surrado e mochila, permitiram meu acesso para conhecer parte das instalações minutos antes de um concerto.
Hoje, na entrada do Teatro Municipal do Rio, aguardando dar a hora do início do espetáculo, presenciei uma cena que me fez lembrar daquele inesquecível dia em Berlim. Um senhor, acompanhado de um adolescente de aprox. 14/15 anos, solicitou ao funcionário que os deixasse entrar por uns instantes para tirar algumas fotos ali  mesmo no térreo, de onde se pode vislumbrar a bela escadaria e o rico interior do nosso querido Teatro Municipal. Cumprindo ordens, e educadamente, o funcionário informou que não seria possível autorizar a entrada do menino porque ele estava de bermuda, alegando que o traje era impróprio para frequentar o local, conforme as regras estabelecidas pela administração do teatro.
Pelo visto, na Alemanha, um dos mais importantes berços da música clássica, é relativamente fácil para um turista, vestido ou não adequadamente, entrar na sede da mais prestigiada orquestra do mundo. Já aqui no Rio, temos um sistema rígido de acesso de visitantes que não contempla situações excepcionais como a que vivi em Berlim e presenciei hoje à noite. Seriam os alemães mais flexíveis?

Sede da Filarmônica de Berlim

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Monumento à arte e ao espírito humano


O final apoteótico da 8ª Sinfonia de Gustav Mahler (conhecida como a Sinfonia dos Mil!!), talvez a obra-prima do compositor, aqui entusiasticamente regida por Simon Rattle, é um monumento à transcendência da arte e do espírito humano. Sua execução requer, supostamente, em torno de 1000 intérpretes, entre orquestra(s), coro(s) e solistas, embora isso raramente ocorra em função da indisponibilidade de músicos e espaço adequado.
Já assisti a um concerto da obra com a OSB, conduzida por Issac Karabtchevsky, na praia de Copacabana, um local totalmente impróprio para espetáculos dessa natureza. Acredito que a experiência de ouvi-la numa sala de concertos como essa do vídeo seja infinitamente mais gratificante. Confiram, são apenas 6 minutos!


quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Uma boa dose de bondade para compensar




Comprei agora há pouco o livro "A longa estrada para casa" (Editora Paz & Terra), de Ben Shephard, que trata do retorno de milhões de refugiados (bálticos, poloneses, ucranianos e até alemães) para seus países e cidades de origem, após o fim da 2ª Guerra na Europa. 
No primeiro parágrafo da introdução, o autor reproduz um pequeno e singelo trecho de uma carta enviada para a namorada por Frank Thompson, jovem oficial britânico, em agosto de 1942, na qual afirma:
- Quando essa guerra acabar, terá de haver um investimento enorme de bondade para compensar o ódio e o sofrimento sem sentido dos últimos anos.
Infelizmente, o jovem Frank morreu em 1944, na Bulgária, ainda durante o conflito, e não pôde testemunhar o gigantesco esforço empreendido pelos países europeus no pós-guerra para a recuperação do continente. Por certo, uma boa dose de bondade, conforme romanticamente profetizara Frank, além dos bilionários recursos do Plano Marshall americano, contribuiu decisivamente para isso. 
Para quem se interessa pelo tema, é um livro indispensável. 

domingo, 11 de novembro de 2012

Assim é o Fluminense!


O título de campeão brasileiro de 2012, conquistado hoje à tarde pelo Fluminense, tem a cara ou o DNA do tricolor carioca. Vitórias sofridas e surpreendentes, com placares apertados e gols no final das partidas, acompanham o time desde sempre em suas conquistas. 
Para ilustrar, vejam uma crônica do saudoso Henfil, flamenguista doente, publicada na revista esportiva Placar logo após o Fluminense conquistar o Campeonato Brasileiro de 1970:

"Meus amigos, não há dúvidas de que Internacional, Palmeiras, Atlético e Cruzeiro serão os finalistas. Nenhuma chance existe para o Fluminense"

"E atenção! Fluminense, Palmeiras, Atlético e Cruzeiro se classificaram"

"Meus amigos, não vai dar outra coisa, o Robertão ficará entre Cruzeiro e Palmeiras"
"E atenção! O Fluminense venceu o Palmeiras por 1 x 0!"

"Meus amigos, o Cruzeiro será o virtual campeão! Hoje deverá passar facilmente pelo Fluminense"
"E atenção! O Fluminense ganhou do Cruzeiro por 1 x 0!"

"Meus amigos, o Fluminense... o Fluminense é um chato!"

sábado, 10 de novembro de 2012

Novamente, Palmeiras e Fluminense


Neste domingo, após 3 anos, Fluminense e Palmeiras se enfrentam novamente em jornada decisiva do campeonato brasileiro, só que agora em situações opostas. 
Em 2009, mais precisamente no dia 08 de novembro, o clube paulista, dirigido por Muricy Ramalho, era o líder do campeonato e jogava no Maracanã contra um Fluminense praticamente rebaixado. O tricolor ganhou de 1 a 0  e, a partir dali, o que se viu foi a queda vertiginosa do Palmeiras na competição, a ponto de perder até a vaga na Libertadores, e a histórica arrancada do Fluminense que o livrou do rebaixamento. 
A título de curiosidade, segue o comentário que enviei aos amigos naquela ocasião, relatando minhas emoções ao presenciar a partida no Maracanã, numa das raras vezes que compareci a um estádio de futebol nos últimos anos. 

Testemunhei ontem à tarde um dos espetáculos mais emocionantes a que já assisti em minha vida de torcedor de futebol. Desde que a televisão passou a transmitir jogos em abundância, em quase todos os dias da semana (e isso já faz muito tempo), deixei de me interessar pela ida aos estádios, prática da qual, na verdade, nunca fui muito adepto mesmo. O conforto proporcionado pela poltrona doméstica e, principalmente, a possibilidade rever o lance por vários ângulos, além da crescente violência dentro e fora dos campos de futebol, foram aos poucos me afastando da ideia de acompanhar de perto o time do coração.
Ontem, cumprindo uma promessa que fiz ao meu sobrinho no domingo passado, após a virada do Flu contra o Cruzeiro no Mineirão, fui com ele ao Maracanã para assistir ao jogo contra o Palmeiras, até então líder do campeonato. Logo no início me surpreendi com a quantidade de torcedores (67 mil) que, independentemente da situação em que o time se encontrava, compareciam ao estádio para apoiá-lo, na missão quase impossível de evitar o rebaixamento. Instantes antes do início do jogo, confesso que me emocionei bastante ao ver dezenas de milhares de torcedores formando um mosaico com as cores do clube. Mais tarde, ao longo da partida, foi possível perceber o amor e a entrega emocional dos torcedores, incentivando o time do início ao fim da partida, como que desejando entrar em campo para ajudar os jogadores. Ao final, foram (ou fomos) todos recompensados com a sofrida vitória, que mantém as pequenas esperanças de permanência da equipe na série A.
Do alto da minha presunção de ser um homem dominado pela razão e, portanto, isento de paixões clubísticas, reconheço que tudo que presenciei ontem serviu-me de enorme lição a respeito do que representa ser torcedor e amar um clube de futebol. É bem verdade que, embora tenha vencido o duelo, os resultados dos jogos da noite acabaram frustrando as expectativas criadas após o triunfo no Maracanã. Agora, o Flu precisa tirar 5 ou 6 pontos dos adversários diretos na luta contra o rebaixamento, o que costuma ser muito difícil faltando apenas 4 rodadas para o fim do campeonato. Mas nada disso apagará o belo espetáculo e as emoções que vivi. Agradeço, em especial, ao meu sobrinho Gabriel pela oportunidade que me ofereceu de aprender um pouco mais sobre o significado de amar um clube e doar-se por inteiro a ele, aconteça o que acontecer, esteja onde estiver. Com humildade, devo admitir que o belo sentimento que ele desenvolveu pelo Fluminense nesses poucos anos como torcedor do clube (tem apenas 19 anos), em algum momento de minha vida, lamentavelmente perdi ou deixei em plano secundário. O que me consola é que, de algum forma, posso me considerar um dos responsáveis por ele ter se tornado tricolor, um orgulhoso e autêntico tricolor.
Para finalizar, entendo que um clube que tem uma torcida como a do Fluminense, ainda numerosa, confiante e apaixonada, apesar dos vexames dos últimos anos, poderá resistir a tudo, até mesmo à incompetência dos dirigentes. Na verdade, a experiência de ontem à tarde comprovou perfeitamente que a torcida do Flu é seu maior patrimônio.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Lembranças da juventude



Em "Ao Entardecer" (2007), uma mulher idosa, no leito de morte, resgata lembranças da juventude e avalia escolhas que marcaram para sempre sua vida. Um filme comovente que conta com uma trilha sonora apropriadamente delicada e evocativa, composta pelo polonês Jan A.P. Kaczmarek, ganhador do Oscar pela música de "Em Busca da Terra do Nunca" (2004). 
"Ao Entardecer" conta com um elenco feminino afinadíssimo, com destaque para Glen Close, Meryl Streep e Vanessa Redgrave em seu único trabalho no cinema ao lado da filha Natasha Richardson, falecida em 2009, aos 45 anos.
O filme é uma bela reflexão sobre a importância das decisões que tomamos ao longo da vida e o que efetivamente fazemos (ou deixamos de fazer) para alcançar a felicidade. O encontro das personagens de Meryl Streep e Vanessa Redgrave, no final, é uma das cenas mais emocionantes do cinema nos últimos anos. Vale pelo filme inteiro!

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Um Scorsese incomum


"A Época da Inocência" (1993) é injustamente um dos filmes mais subestimados de Martin Scorsese, talvez por abordar um tema (o amor) pouco explorado na extensa filmografia do cineasta.   
Trata-se de uma elegante e sutil reflexão sobre uma época (final do século XIX) em que as convenções sociais falavam mais alto do que os sentimentos, até mesmo as paixões mais arrebatadoras. 
A excelente música de Elmer Bernstein (vídeo abaixo), um dos mais belos trabalhos do compositor para o cinema, enfatiza magistralmente a atmosfera romântica que permeia toda a história. O cd com o score, que fazia falta em minha extensa coleção de trilhas sonoras, encontrei hoje, após garimpar num sebo do centro da cidade. Agora, só falta achar o romance homônimo de Edith Wharton, premiado com o Pulitzer de 1921, que deu origem ao filme e a outras duas adaptações cinematográficas, em 1924 e em 1934. 


sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Livros, filmes e emoções



Após quase 30 anos do lançamento do filme, finalmente está disponível no mercado brasileiro o dvd de "Os Vivos e os Mortos" (1989), dirigido por John Huston em seu último trabalho para o cinema.
A produção é baseada em "Os Mortos", último conto da coletânea "Os Dublinenses", de James Joyce, publicada pela primeira vez em 1914, que se tornou uma das obras mais consagradas do escritor irlandês.  
Considero o trecho final do conto digno de constar das melhores antologias da literatura ocidental. O curioso é que, após várias leituras, percebi que a admiração que nutria pela obra de Joyce se devia, basicamente, à minha profunda empatia com o personagem Gabriel e suas inquietações. Com o passar do tempo, concluí que essa obra de Joyce revelava muito mais de mim do que eu supunha, sem contar que sua primorosa narrativa já havia me proporcionado momentos de verdadeiras epifanias, aquelas raras sensações de conexão direta com o Criador.
Para quem curte cinema e literatura, recomendo ambos, o filme e o livro, em qualquer ordem, porque, diferentemente do que costuma ocorrer com adaptações de obras literárias para o cinema, o filme também é belíssimo e só enaltece o trabalho de Joyce. 
O vídeo acima exibe a cena do filme baseada exatamente no trecho final do conto, transcrito abaixo.

"Gretta logo adormeceu.
Gabriel debruçou-se na cômoda e contemplou sem ressentimento os seus cabelos emaranhados, a boca entreaberta, ouvindo-lhe a profunda respiração. Então havia esse romance em sua vida: um homem morrera por ela. Quase já não o magoava pensar no pouco que ele, marido, representara em sua vida. Observava-a enquanto dormia, como se nunca houvessem vivido juntos. Seus olhos curiosos fitaram longamente o rosto e os cabelos, e ao pensar em como devia ser ela naquele tempo, no tempo da primeira juventude, uma estranha, sincera piedade pela esposa invadiu-lhe a alma. Não ousava dizer, nem para si mesmo, que seu rosto já não era belo, embora soubesse que já não era o rosto pelo qual Michael Furey afrontara a morte.
Talvez não lhe tivesse contado toda a história. Seus olhos moveram-se para a cadeira sobre a qual ela atirara algumas roupas. Um cordel da anágua pendia no chão. Uma bota estava em pé, o cano dobrado para baixo; a outra tombada de lado. Pensou no tumulto que o agitara uma hora antes. De onde surgira aquilo? Da ceia, do tolo discurso, do vinho, da dança, da brincadeira quando se despediam no vestíbulo, do prazer de passear pelo cais sobre a neve? Pobre tia Júlia! Ela também logo seria uma sombra junto às sombras de Patrick Morkan e seu cavalo. Surpreendera esse lúgubre presságio em sua face, quando ela cantava. Muito em breve, talvez, estaria sentado no mesmo salão, vestido de preto, o chapéu de seda sobre os joelhos. Os reposteiros estariam cerrados e tia Kate, sentada a seu lado, chorando e assoando o nariz, contar-lhe-ia como tia Júlia morrera. Revolveria o cérebro à procura de palavras que pudessem consolá-la e só diria frases fúteis e vãs. Sim, isso logo iria acontecer.
O ar gélido do quarto fê-lo estremecer. Deslizou cautelosamente sob as cobertas e acomodou-se ao lado da esposa. Um por um, estavam todos se transformando em sombras. Seria melhor precipitar-se na morte no apogeu de uma paixão do que extinguir e murchar lentamente com a velhice. Pensou como aquela mulher, adormecida a seu lado, ocultara por tantos anos a imagem do seu amado a afirmar-lhe que não queria viver. Pranto generoso invadiu-lhe os olhos. Nunca se sentira assim por uma mulher, mas sabia que isto era amor. As lágrimas cresceram nos olhos e ele imaginou ver na penumbra do quarto um jovem parado sob uma árvore encharcada. Outras formas pairavam ali. Sua alma acercava-se da região habitada pela vasta legião dos mortos. Pressentia, mas não podia apreender suas existências vacilantes e incertas. Ele próprio dissolvia-se num mundo cinzento e incorpóreo. O mundo real, sólido, em que os mortos tinham vivido e edificado, desagregava-se.
Leves batidas na vidraça fizeram-no voltar-se para a janela. A neve tornava a cair. Olhou sonolento os flocos prateados e negros que despencavam obliquamente contra a luz do lampião. Era tempo de preparar a viagem para o oeste. Sim, os jornais estavam certos: a neve cobria toda a Irlanda. Caía em todas as partes da sombria planície central, nas montanhas sem árvores, tombando mansa sobre o Bog of Allen e, mais para o oeste, nas ondas escuras do cemitério abandonado onde jazia Michael Furey. Amontoava-se nas cruzes tortas e nas lápides, nas hastes do pequeno portão, nos espinhos estéreis. Sua alma desmaiava lentamente, enquanto ele ouvia a neve cair suave através do universo, cair brandamente – como se lhes descesse a hora final – sobre todos os vivos e todos os mortos."


Transcrito de "Os Dublinenses", de James Joyce - Editora Civilização Brasileira

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Um filme perturbador

Comentei com amigos, no último domingo, sobre o filme "A Estrada" (2009), que mostra a luta de pai e filho pela sobrevivência num mundo devastado por um cataclismo de proporções planetárias (de origem não explicada), onde, aparentemente, os valores básicos da civilização foram extintos.
Fiz menção especificamente a uma cena que considero uma das mais cruéis que já vi no cinema, quando o pai, na tentativa de preservar a vida e a do filho (aprox. 10 anos), despoja um maltrapilho de tudo que ele carrega, incluindo a roupa que veste, deixando-o completamente nu, num cenário frio e desolado, e entregue à própria sorte.
Convenhamos, uma situação em que um pai ensina ao filho pequeno que a única maneira de sobreviver é abandonando o pouco que lhe resta de compaixão e humanidade contém uma mensagem extremamente perturbadora.  
Mas acho que o filme é mais do que isso. Embora permeada de tristeza e desilusão, pode-se afirmar que a história tem um final relativamente esperançoso, capaz de redimi-la e também de nos libertar. Vale a pena assistir.
Os vídeos abaixo apresentam o trailer do filme e a sensível trilha sonora composta por Nick Cave e Warren Ellis.




sexta-feira, 26 de outubro de 2012

"Baaria - A Porta do Vento", refilmagem ou continuação de "Cinema Paradiso"?


Com "Cinema Paradiso", de 1988, Giuseppe Tornatore realizou uma bela e comovente homenagem ao cinema. A amizade entre o pequeno Toto (Salvatore Cascio) e o inesquecível projecionista Alfredo, interpretado pelo falecido Philippe Noiret, embalada pela encantadora música de Ennio Morricone, emocionou e fez chorar plateias do mundo inteiro, consagrando uma história de amor ao cinema que atravessou gerações.
Em 2009, Tornatore retomou a atmosfera romântica e bem-sucedida de "Cinema Paradiso", lançando a superprodução "Baaria - A Porta do Vento", supostamente uma continuação do filme anterior (para muitos, uma refilmagem). A nova produção conta a história de três gerações de uma família também siciliana, traçando um painel da cena política italiana ao longo de 50 anos, com foco no romance entre os jovens Peppino e Mannina e na trajetória de vida do menino, desde a infância nos anos 30, até a maturidade, com a consolidação de sua carreira política no Partido Comunista. 
Mas o tom épico do filme, que contrasta inicialmente com o clima intimista de "Cinema Paradiso", não é de todo resolvido. Reiteradas vezes, quando a história parece evoluir para um aprofundamento do contexto político, o roteiro mantém a atenção nas questões mais pessoais e afetivas do protagonista, relegando a um plano secundário aspectos relevantes da história contemporânea da Itália. 
Embora, em maior ou menor medida, isso possa comprometer a consistência narrativa de "Baaria - A Porta do Vento", a apreciação do filme depende mesmo é da marca deixada por "Cinema Paradiso" na mente do espectador, que precisa evitar a armadilha de comparar as duas obras, já que ambas contêm vários elementos em comum.


segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Um clássico eterno do humanismo

Revi recentemente "Ladrões de Bicicleta" (1948), de Vittorio de Sica, e mais uma vez fiquei emocionado com uma das mais belas sequências do filme, verdadeiro ícone do movimento neorrealista italiano. Trata-se do momento em que o personagem Ricci, um homem humilde, honesto e trabalhador, resolve roubar uma bicicleta, na tentativa de preservar o precário emprego que conquistou a duras penas na empobrecida Roma do pós-guerra. 
A sequência começa com o personagem decidindo realizar o roubo, ao ver uma bicicleta sem a vigilância do dono. Antes de agir, Ricci pede a Bruno, seu filho de aprox. 8 anos, para esperá-lo em outro ponto da cidade. Em seguida, ele rouba a bicicleta, mas é flagrado pelo dono, que aparece repentinamente, e passa a ser perseguido por várias pessoas, aos gritos persistentes de LADRÃO!, LADRÃO!
O filho, que havia sido despachado pelo pai um pouco antes, ainda está por perto e acaba presenciando todo o episódio. A expressão do menino, surpreso e desesperado com a atitude do pai, nos comove tão profundamente como poucas vezes o cinema foi capaz de fazê-lo até hoje. Podemos observar o pai sendo alcançado pelos perseguidores e o menino correndo, aos prantos, para ficar ao seu lado, o que acaba por livrar Ricci da prisão ou de um possível linchamento. Mas não de um profundo sentimento de humilhação que o acompanha nos momentos seguintes, quando o personagem se dá conta da gravidade do erro cometido, lamentavelmente testemunhado pelo próprio filho. 
Por alguns instantes, que parecem eternos, os dois caminham em silêncio, de mãos dadas e às lágrimas, numa cena emocionante e também constrangedora, talvez por sabermos que estaríamos todos, homens de bem, sujeitos a cometer o mesmo erro, naquela situação de extrema pobreza e necessidade. Enfim, uma sequência antológica impregnada do humanismo característico das produções neorrealistas, que figura certamente entre as mais importantes de toda a história do cinema.



sexta-feira, 19 de outubro de 2012

"Nada que é dourado permanece"


"Vidas sem Rumo", singelo e cativante filme de Francis Ford Coppola, conta com uma bela abertura ao som de "Stay Gold", canção interpretada por Steve Wonder e inspirada no poema "Nada que é dourado permanece", de Robert Frost (1874-1963), transcrito abaixo:

"O primeiro verde da natureza é dourado,
Para ela, o tom mais difícil de fixar.
Sua primeira folha é uma flor,
Mas só durante uma hora.
Depois folha se rende a folha.
Assim o Paraíso afundou na dor,
Assim a aurora se transforma em dia.
Nada que é dourado permanece." 

O livro que deu origem ao filme, de Susan Eloise Hinton, escrito quando a autora tinha apenas 17 anos, foi reeditado recentemente no Brasil, uma boa oportunidade para as novas gerações conhecerem a sensível obra de Hilton.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Definitivamente, Tchaikovsky



A G. Ermakoff Casa Editorial acaba de lançar no Brasil a biografia definitiva de Piotr Ilitch Tchaikovsky, um dos mais populares compositores eruditos de todos os tempos. 
Autor de obras consagradas pelo público universal, dentre elas, balés, óperas, concertos e sinfonias, Tchaikovsky ganha agora sua biografia mais fiel e completa, escrita pelo historiador russo Alexander Poznansky, que pesquisou por 25 anos toda a documentação disponível sobre o compositor, incluindo mais de 7.000 cartas (enviadas e recebidas) e extensos arquivos só revelados recentemente.
É um volume com mais de 900 páginas, com merecida capa dura, que revela a rica e atribulada trajetória de vida de um artista querido e apreciado pelas mais diferentes plateias do mundo, encantadas com as belas e comoventes melodias que caracterizam grande parte de suas obras.
Claro, é imperdível e já comprei!

sábado, 13 de outubro de 2012

Pequenos filmes, grandes músicas

Já escrevi inúmeras vezes sobre o impressionante talento do saudoso Jerry Goldsmith, autor de tantas trilhas sonoras memoráveis para o cinema, como "Patton", "Star Trek", "A Profecia", "Poltergeist" etc. 
Ouvi agora há pouco mais um trabalho do compositor que depõe exatamente sobre sua maior qualidade, que era a capacidade de transformar filmes menores em produções superiores pela excelência de suas composições. 
Acompanho essa arte maravilhosa (música para filmes) há mais de 30 anos e a maioria dos poucos profissionais que conheci com essa habilidade é formada justamente pelos precursores (ou pioneiros), compositores europeus como Max Steiner, Franz Waxman, Dimitri Tiomkin, Erich Wolfgang Korngold e Miklos Rozsa, que, ainda nas primeiras décadas do século passado, estabeleceram os padrões do que conhecemos hoje como score orquestral para filme.
"Pequenos Guerreiros" é um exemplo perfeito dessa arte difícil e rara que consiste em "salvar" ou, pelo menos, promover um filme mediano por meio de uma trilha sonora de alta qualidade. É uma aventura familiar, sem maiores pretensões, envolvendo adolescentes e brinquedos belicistas. Embora seja um filme bem produzido, que conta até com um bom roteiro, suspeito que só tenha permanecido em minha memória por causa da bela e funcional música de Jerry Goldsmith, recheada de humor, autoparódia e até mesmo passagens de estilo épico. Tudo isso certamente muito acima do que a produção poderia sugerir a um compositor menos talentoso e criativo. 


sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Em defesa do futuro


Um prêmio de natureza eminentemente política, o Nobel da Paz deste ano acaba de ser concedido à União Europeia pelo Comitê Nobel da Noruega. 
Após as duas grandes guerras ocorridas na primeira metade do século XX, que tiveram o continente europeu como palco principal, alguns países da região resolveram se unir para promover a recuperação de suas economias combalidas pelos conflitos. Esse processo culminou com a assinatura do Tratado de Roma, em 1957, que criou a Comunidade Econômica Europeia (CEE), embrião da entidade hoje conhecida como União Europeia, que reúne 27 países com interesses políticos e econômicos comuns. 
Um belo e ambicioso projeto que, em função da crise econômica iniciada em 2008, vem enfrentando desafios cada vez maiores à sua sobrevivência.
Acredito que a concessão do prêmio Nobel à União Europeia, anunciada hoje na Noruega, tenha intensa motivação política, na tentativa de inspirar governos e políticos europeus a dar continuidade ao esforço de construção de uma sólida união dos povos, em defesa do bem-estar e da paz no continente. 
Na verdade, pelo forte simbolismo que encerra, o sucesso dessa experiência interessa a toda a humanidade.


quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Retratos do Brasil



Após "1808" e "1822", sucessos editoriais de Laurentino Gomes que contam, respectivamente, as histórias da chegada da família real portuguesa ao Brasil e do período da independência do país, tivemos, em março deste ano, o lançamento de "O império é você", no qual o escritor espanhol Javier Moro publica relatos polêmicos sobre a vida de D. Pedro I.
Nesta semana, chega às livrarias "1565 - Enquanto o Brasil Nascia", do jornalista Pedro Dória, que aborda a contribuição de portugueses, franceses, índios e negros para a formação da identidade do país e para a fundação das cidades brasileiras. 
Para quem já leu os três livros anteriores, torna-se indispensável conferir mais essa obra sobre a história ainda mal contada do país, tema que vem se tornando habitual no mercado editorial brasileiro, o que não é pouca coisa numa nação sem memória.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

"O destino bate à porta"


Faz algum tempo, tive o privilégio de assistir ao concerto da Orquestra Sinfônica Brasileira executando a belíssima 5ª sinfonia de Beethoven, também conhecida como "Do Destino". 
Certamente, é a obra mais popular do compositor alemão. Desde os já famosos quatro primeiros acordes (tchan tchan tchan tchaaaan!!), nós, ouvintes mortais, de diferentes origens e preferências, somos arrebatados pela combinação de vigor e delicadeza que permeia toda a obra. É música em estado puro. Os próprios músicos costumam se entregar com disposição incomum em sua execução. 
Não há como negar, a 5ª Sinfonia de Beethoven constitui-se em verdadeiro monumento musical, e dá testemunho da grandiosidade do espírito humano e de sua inesgotável capacidade criativa. Se o compositor não tivesse feito mais nada, ainda assim, com essa única obra, teria entrado para a história da música e da arte ocidental. 
O vídeo mostra o eletrizante último movimento da sinfonia, com a Orquestra Filarmônica de Viena, sob a regência do maestro alemão Christian Thielemann.



domingo, 7 de outubro de 2012

A trilogia de Paris



Depois de "Os Anos Loucos" e "Os Anos Sombrios", ambos de William Wiser, sobre os anos 20 e 30 (respectivamente) em Paris, foi lançado no Brasil o livro "Paris - A Festa Continuou", de Alan Riding, que trata do período de ocupação da capital francesa pelos nazistas, entre 1940 e 1944.
A obra de Riding encerra uma curiosa trilogia sobre as décadas que transformaram Paris em símbolo de arte e cultura no século XX.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

"Casablanca" - Um clássico em alta definição!



Já está disponível no mercado nacional a edição comemorativa dos 70 anos de "Casablanca", vencedor do Oscar de 1943 e um dos maiores clássicos do cinema mundial. A exemplo do lançamento no mercado americano, a edição brasileira agora é em blu-ray (HD) triplo, recheada de extras e acompanhada de um pequeno livro com fotos e informações sobre a produção.
Ao longo dessas 7 décadas, é claro, muito já se falou e escreveu sobre o filme, mas vale a pena destacar alguns detalhes. 
Se considerarmos todas as dificuldades enfrentadas durante as filmagens, e o resultado final obtido nas telas, Casablanca representa um verdadeiro milagre cinematográfico.
O filme conta uma das mais encantadoras histórias de amor do cinema e tem presença obrigatória em qualquer lista dos maiores clássicos de Hollywood. Adaptado de uma peça nunca produzida (Everybody Goes to Rick's), o texto foi escrito inicialmente pelos irmãos Julius e Philip Epstein, e por Howard Koch. Mais tarde, com o abandono do projeto pelos irmãos Epstein, coube a Koch concluir o roteiro, eleito há alguns anos pelo Sindicato dos Roteiristas da América (WGA) como o melhor de todos os tempos.
Problemas não faltaram ao longo da produção. Muitas cenas foram escritas à noite para filmar já na manhã seguinte. Nesses casos, o elenco só recebia os diálogos no próprio dia da filmagem. Apesar disso, a história de Rick e Ilsa vem emocionando plateias de diferentes culturas há várias gerações.
A trilha sonora coube a Max Steiner, um dos mais conceituados compositores de Hollywood, já naquela época. No entanto, a canção-tema (As Time Goes By) é de autoria de Herman Hupfeld, e foi escrita para uma peça encenada na Broadway, em 1931, pouco conhecida do grande público. Steiner tentou compor um tema original, mas os produtores insistiram no aproveitamento da música de Hupfeld, que acabou se tornando o símbolo do filme e do próprio romantismo no cinema.
De todas as qualidades de Casablanca, destaca-se a composição de um dos mais belos personagens da história da sétima arte. Embora cínico, Rick, vivido por Humphrey Bogart, tem um comportamento que evidencia duas indiscutíveis provas de amor. Primeiro, renuncia à mulher de sua vida, Ilsa (Ingrid Bergman), deixando-a partir com Laszlo (Paul Henreid) por considerá-lo mais capaz de fazê-la feliz. Segundo, ao permitir a fuga de Laszlo, salvando sua vida, Rick contribui para o movimento de resistência aos nazistas, o que revela um caráter nobre e altruísta que o personagem insiste em dissimular ao longo de todo o filme.
O fato é que Casablanca tem qualidades raramente reunidas numa mesma produção cinematográfica. É um filme que marcou uma época, mas que continua encantando gerações seguidas de cinéfilos, por tratar de temas universais que não envelhecem. 

terça-feira, 2 de outubro de 2012

"A Noite Americana": Truffaut, Delerue e o amor ao cinema

Somente a parceria de dois gênios poderia nos proporcionar essa obra-prima inesquecível. A música composta pelo saudoso Georges Delerue confere ao filme de François Truffaut, o mais cinéfilo dos cineastas, o adequado tom poético da produção. 
"A Noite Americana" é uma verdadeira declaração de amor ao cinema (a música começa aos 30 segundos).

A Gênese do Mal

"A Fita Branca", do diretor austríaco Michael Haneke, é um filme ambientado numa pequena aldeia do norte da Alemanha, em 1913, que especula sobre o processo que teria levado ao surgimento do nazismo na sociedade alemã. 
Consagrada em Cannes com a conquista da Palma de Ouro, em 2009, a produção foi rodada em cores e copiada, mais tarde, em preto e branco. O roteiro, escrito pelo próprio Haneke, é excelente e o elenco, praticamente desconhecido por aqui, tem atuação impecável, incluindo as crianças, com destaque para o menino que usa a fita branca. 
A curiosidade é que o filme não dispõe de trilha sonora original, nem mesmo nos créditos. As poucas músicas utilizadas em cena são diegéticas e integram o ambiente filmado, sendo ouvidas também pelos personagens (canto, piano etc.), um recurso de linguagem perfeitamente adequado à proposta do filme, que não requer artifícios dramáticos adicionais. Enfim, uma produção incomum e que faz pensar, ainda que, eventualmente, se possa discordar das teses do diretor. 



sábado, 29 de setembro de 2012

O primeiro ex-Beatle


É realmente singular a história de Stuart Sutcliffe, o primeiro baixista dos Beatles. Ele fazia parte da formação original da banda na turnê de Hamburgo, em 1960, mas não seguiu com os demais para ficar com a nova namorada alemã e dedicar-se à pintura, sua verdadeira paixão. 
O mais comovente nessa história foi o triste fim do rapaz, morto meses depois, vítima de um derrame cerebral, ainda aos 21 anos. Na verdade, a morte de jovens é sempre um assunto que me sensibiliza particularmente. Como não podemos saber em que se transformariam, fica sempre uma aura de mistério e encanto em torno desses personagens.
No mais, é curioso como algumas pessoas, a exemplo de Sutcliffe, que acabou não integrando a formação definitiva da banda mais popular de todos os tempos, se tornam famosas e entram para a história justamente pelo que deixaram de fazer.



Paul McCartney e Stuart Sutcliffe na fase inicial da banda

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Arte e Virtude


Ao ouvir "As Quatro Últimas Canções", bela e comovente obra composta por Richard Strauss já no fim da vida, aos 84 anos, pensei em como, desgraçadamente, alguns grandes artistas acabam manchando suas biografias, por ação ou omissão, em períodos sombrios da história.
Em relação à música, há vários exemplos de compositores, músicos e regentes que estiveram associados ao nazismo durante a 2ª Guerra. Por certo, alguns não chegaram a se envolver diretamente com o regime, mas também não tiveram coragem suficiente para se opor publicamente ao movimento, passando a desfrutar de eventuais benefícios concedidos pelos nazistas. Tudo isso, claro, concedendo um necessário "desconto" relativo às circunstâncias da época, quando a vida de opositores do regime valia muito pouco.
No caso particular de Richard Strauss, ele teria aceitado a nomeação para o cargo de diretor musical do III Reich e, mais tarde, dedicado uma canção a Joseph Goebbels, então ministro da propaganda de Hitler. O fato é que, hoje em dia, raramente lemos algo sobre Strauss sem que nos deparemos com referências críticas a sua associação com o nazismo, o que é perfeitamente natural, já que é (quase) tudo verdade e faz parte da História.
Por outro lado, também é lamentável porque se trata de um compositor de rara inspiração, que nos deixou um precioso legado musical, com destaque para as óperas "Salomé", "Elektra" e "O Cavaleiro da Rosa", além dos poemas sinfônicos "Morte e Transfiguração" (meu preferido) e "Assim falou Zaratustra", este último celebrizado pela utilização na sequência de abertura do filme "2001: Uma Odisseia no Espaço".
Na verdade, posturas equivocadas, por medo ou convicção, não são um monopólio de gente ligada à música. Na década de 50, nos EUA, durante o período do macarthismo, muitos intelectuais e artistas consagrados do cinema sucumbiram à febre anticomunista promovida pelo senador Joseph McCarthy, delatando colegas, a maioria para evitar perseguição e boicote profissional.
O que nos serve de alento, ou nos redime, é que, apesar dos riscos, muitas vezes de morte ou de privação da liberdade, há aqueles que reagem às injustiças e ao terror. Em Hollywood, Humphrey Bogart e John Huston, dentre outros, resistiram às pressões para delação de companheiros, ao contrário do diretor Elia Kazan, que entregou vários nomes ao comitê do senador McCarthy. Já no caso da música, o regente italiano Arturo Toscanini, por exemplo, nunca se rendeu aos fascistas e a Mussolini, tendo desafiado o ditador várias vezes enquanto trabalhou na Itália.
Como os artistas, acima de tudo, são seres humanos, arte e virtude, para o bem ou para o mal, nem sempre caminham juntas.

Paisagem idílica da Baviera que inspirou várias obras de Richard Strauss

domingo, 23 de setembro de 2012

"Antes da Meia-Noite"


Segundo o site Deadline, o diretor Richard Linklater confirmou a conclusão das filmagens do terceiro longa-metragem sobre o romance entre Celine (Julie Delpy) e Jesse (Ethan Hawke), protagonistas de "Antes de Amanhecer" (1995) e "Antes do Pôr-do-Sol" (2004). 
"Antes do Amanhecer" teve Viena como cenário para o romance. Já Paris foi a cidade em que o casal se reencontrou 9 anos depois, em "Antes do Pôr-do-Sol". O título do terceiro filme é "Antes da Meia-Noite" e a cidade escolhida para cenário foi Cardamili, na Grécia. Como ocorreu nas duas primeiras produções, o roteiro do terceiro filme foi assinado pelos três, Julie, Ethan e Linklater. 
Quem gostou dos dois primeiros filmes, como eu, deve estar ansioso para assistir a essa sequência, cujo lançamento está previsto para 2013. 


sábado, 22 de setembro de 2012

Ao mestre, com carinho


Jerry Goldsmith, falecido em 2004, compôs um belíssimo score para o filme "Explorers" (1985), ou "Viagem ao Mundo dos Sonhos", título da produção no mercado nacional. Trata-se de uma história bobinha (como tantas outras de Hollywood) que já estava esquecida em minha desbotada memória antes de rever o filme recentemente, mas a música figura entre as mais expressivas da profícua carreira do compositor.
Nascido e criado em Hollywood, Jerry Goldsmith estudou com o mestre Miklós Rozsa (Ben Hur, Quo Vadis, Rei dos Reis etc) e compôs para quase 200 filmes. Seus trabalhos mais destacados foram para "Jornada nas Estrelas", "O Planeta dos Macacos", "A Profecia", "Chinatown", "Patton", "Poltergeist", "O Vingador do Futuro" e "A Múmia". Na verdade, pouquíssimas trilhas de Jerry podem ser consideradas medíocres.
O fato é que em "Explorers" o compositor nos oferece uma obra lírica por excelência. Sua música embala com ternura e sensibilidade a ingênua aventura intergaláctica dos três personagens teens da história. Ao ouvi-la, ainda que sem as imagens, podemos resgatar um pouco a criança que todos fomos um dia, ou que nunca deixamos de ser verdadeiramente. Em especial, destaco o corte "have a nice trip", da cena que encerra o filme, na qual os meninos, com sua fértil imaginação, sobrevoam a cidade. A doce melodia que acompanha as imagens é pura magia musical.
Embora não esteja mais entre nós, agradeço a Jerry Goldsmith pelo mundo de beleza e encantamento que proporcionou a muitos que tiveram a oportunidade de conhecer suas obras. 
O vídeo contém uma excelente coletânea de trabalhos do compositor, que inclui um pequeno trecho da música de “Explorers”. 


O exemplo de Barcelona


A visita que fiz a Barcelona no ano passado, quando levei minha irmã para conhecer pessoalmente os primos espanhóis, serviu para consolidar as melhores impressões que eu já tinha da capital catalã. O ponto alto da cidade é, em minha opinião, o Port Vell, porto antigo que foi completamente reformado para os Jogos Olímpicos de 92, dispondo hoje de cinemas, bares, discotecas, shopping etc. O Paseo de Gracia também é muito bonito, lembrando, sem favor algum, a famosa Champs Elysées de Paris.
Com tudo que vi, fica a preocupação com nosso compromisso olímpico para 2016. É difícil imaginar o Rio oferecendo à comunidade esportiva internacional a invejável infraestrutura esportiva, urbana e de transporte disponível em Barcelona. Não creio que em apenas 4 anos possamos realizar todas as obras necessárias para o evento. Devo esclarecer que minhas reservas não dizem respeito à competência dos brasileiros para fazer e sim à honestidade e à seriedade das autoridades e políticos envolvidos no projeto. Tomara que eu esteja equivocado.
O vídeo abaixo mostra Barcelona antes e depois das Olimpíadas de 1992, revelando as profundas transformações realizadas na cidade para o evento, em apenas 6 anos.


Tributos a um grande artista


Dois vídeos em homenagem a Georges Delerue, compositor francês já falecido que encantou gerações com melodias ternas e delicadas, para filmes de profundo sentimento humanista.
A obra de Delerue é um testemunho de sua extrema sensibilidade e fez dele um artista único em seu tempo.


"Nunca te Amei"


"Nunca te Amei" é uma refilmagem (1994) do clássico inglês "The Browning Version", de 1951. A história trata da iminente aposentadoria de um professor rigoroso (pouco estimado pela maioria dos alunos) e suas relações com a esposa infiel e um aluno sensível. A versão original é a única disponível em dvd no mercado nacional, mas ambas já foram exibidas na Net. Um excelente programa para quem trabalha com educação.
O vídeo contém uma das cenas mais emocionantes do filme, embora aqui esteja fora do contexto.


sexta-feira, 21 de setembro de 2012

"O Boulevard do Crime"


A França produziu nos anos 40 "O Boulevard do Crime", filme dirigido por Marcel Carné, um dos maiores representantes do realismo poético, principal corrente estética do cinema francês no período. E poderia não ter produzido mais nada que, ainda assim, estaria garantido o lugar de honra do país na cinematografia mundial. 
O filme, que faz uma representação ao mesmo tempo poética e cínica da boemia, da cena teatral e dos cabarés de Paris no início do séc. XIX, é uma obra-prima indiscutível, resultado da parceria bem-sucedida do cineasta com o pintor e poeta Jacques Prévert. 
Além da magnífica direção de Carné, a produção conta com performances marcantes de seu triângulo amoroso, formado por Garance (Arletty), Fréderick Lemaitre (Pierre Brasseur) e Baptiste (o mímico, vivido por Jean-Louis Barrault), e com o excelente roteiro de Prévert, que joga o tempo inteiro com os conceitos de ficção/realidade e com os códigos de representação do cinema e do teatro, ignorando inteligentemente suas fronteiras. 
Esses elementos reunidos conferem à produção uma rara excelência, principalmente se considerarmos as enormes dificuldades para sua realização, num período conturbado como foi o início da década de 40, com a França ocupada pelos nazistas e dividida entre os colaboracionistas e a resistência.
Após mais de meio século, "O Boulevard do Crime" continua sendo uma obra complexa e de vários significados, apesar de sua aparente simplicidade. E na era do blu-ray e das restaurações/remasterizações digitais, que operam milagres na recuperação de sons e imagens, o filme merece ser descoberto pelas novas gerações de cinéfilos.