domingo, 26 de abril de 2015

O dia em que um "beatle" me fez chorar



Acompanhando o noticiário sobre o terremoto no Nepal e as avalanches no Everest, que provocaram milhares de vítimas na região, lembrei-me de um episódio ocorrido em minha viagem à Alemanha no verão de 1998. Não, não tem nada a ver com acidente, tragédia ou coisa parecida.
Era um bonito dia de agosto (verão) e os amigos alemães resolveram me levar, junto com dois outros amigos brasileiros, para passear em Speyer, uma cidade próxima de Heidelberg, onde vivem até hoje, para conhecer a belíssima basílica românica local e também o museu tecnológico da cidade. Após circular bastante pelo museu, resolvemos assistir ao filme "Everest" no cinema IMAX local.
Eu não sabia nada sobre o filme. A decisão de assistir partiu mais da oportunidade de conhecer a tecnologia IMAX, geralmente disponível numa sala com uma tela gigantesca e áudio com milhares de watts de potência, algo, então, inimaginável pra mim.
Logo que nos acomodamos nas poltronas, uma funcionária do cinema, muito bem vestida, fez a apresentação do "evento" (em alemão, é claro), discorrendo sobre a tecnologia IMAX, as características que a distinguem das demais e os recursos de imagem e som de última geração disponíveis. É claro que eu só soube disso depois, traduzido por minha amiga brasileira radicada na Alemanha.
Tratava-se, na verdade, de um documentário narrado por Liam Neeson sobre a escalada do Everest por uma equipe de alpinistas, ocorrida em maio de 1996, que teve um final trágico. Sei disso porque li sobre o filme ao retornar ao Brasil, já que toda a narração foi dublada no idioma local, prática comum na exibição de filmes nos cinemas do país, como ocorre, aliás, na maior parte da Europa. Em resumo, não entendi uma única palavra do que foi dito, o que não me impediu de ficar com lágrimas nos olhos durante e após a exibição, em meio a uma legião de adolescentes. No final, todo mundo saiu comentando alegremente sobre o filme, e eu ali com os olhos vermelhos e cheio de vergonha.
Alguns devem estar se perguntando, mas que diabos esse cara viu e ouviu no filme que o deixou tão comovido, já que não "entendeu" nada do que foi narrado? Bem, é aí que, provavelmente, entram a magia do cinema e a tecnologia IMAX. É verdade, eu não entendi o que foi dito pelo narrador, porém, e talvez por isso, prestei uma atenção obsessiva nas imagens gigantescas e impressionantes do Everest, e especialmente na belíssima trilha sonora do filme, gravada por grande orquestra e reproduzida com um sistema de som quase "ensurdecedor". Um show verdadeiramente hipnótico que me emocionou de tal maneira que só me recompus mesmo no bar do museu, degustando (lembro muito bem) uma excelente cerveja de trigo da região.
Mas, afinal, onde entra nessa história o "beatle" que fez o Ecio chorar? Bem, o beatle a quem me refiro é George Harrison, autor da maior parte das músicas utilizadas no filme, brilhantemente arranjadas para orquestra pela dupla Steve Wood e Daniel May. Nunca tinha ouvido aquelas músicas de George Harrison (menos ainda executadas por uma orquestra) embalando uma história de superação e conquista como a que foi mostrada no documentário. Reconheço, portanto, que foram as canções de Harrison, mais do que as belas imagens do Everest, que me comoveram tanto naquela já longínqua tarde de agosto de 1998 na Alemanha.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Gaudí e o orgulho catalão



Mais uma vez inspirado por uma postagem da amiga Catalina Casellas​, revelo um singelo (e inesquecível) episódio que vivenciei na Espanha alguns anos atrás, mais precisamente no verão de 2003. Naquela oportunidade, após um lanche oferecido por um vizinho de minha prima de Barcelona, resolvemos prolongar o encontro conversando sobre assuntos diversos, incluindo Brasil, Espanha, futebol e também "papagaios de pirata", dentre outros temas. Num dado momento, comentei sobre minha admiração pelo arquiteto catalão Antonio Gaudí e sua habilidade para lidar com formas, cores e elementos diversos que dão um caráter singular às suas obras. E concluí destacando a morte trágica do arquiteto, ao ser atropelado por um bonde em Barcelona. Mal terminei a frase, o gentil anfitrião, talvez impressionado com o fato de um brasileiro conhecer tanto sobre a vida e a obra de uma das maiores personalidades da Catalunha, pediu licença, se dirigiu ao quarto e, em seguida, voltou para me presentear com um belíssimo livro de arte contendo a antologia fotográfica completa das obras de Gaudí. É claro que fiquei encantado com o "regalo", embora soubesse da dificuldade que teria para carregá-lo, já que, além de grande, pesava bastante. Minha prima até suspeitou que eu não pudesse trazer, mas decidi que aquele livro eu traria de qualquer maneira, não só pela importância do conteúdo, mas também pelo gesto generoso do anfitrião. O fato é que preservo o livro (foto acima) até hoje com todo o carinho, e jamais me esquecerei daquela tarde agradável na companhia dos primos e do orgulhoso amigo catalão.
O vídeo “Love Casa Batllò”, com duração de apenas 2 minutos e meio, venceu o Grande Prêmio no Festival Internacional de Filmes Turísticos de Riga, e mostra o interior da Casa Batllò, em Barcelona, uma das obras mais geniais e emblemáticas de Gaudí, percorrendo todos os seus ambientes com o uso de efeitos especiais que conferem vida própria à edificação. Um trabalho belo e engenhoso. Vale a pena conferir! 

sábado, 11 de abril de 2015

O sentimento cristão em Bach, Handel, Goya e Velazquez



O "Te Deum de Dettingen", composto por Handel, em 1743, em homenagem à vitória dos ingleses sobre os franceses na batalha de Dettingen (Baviera), é uma das mais belas (e menos conhecidas) obras do compositor alemão, que emigrou ainda jovem para a Inglaterra. 
A música funciona como uma espécie de ação de graças (daí o nome "Te Deum") pela vitória do exército inglês, comandado pelo Rei George II. O cd acima é um dos mais preciosos de minha extensa coleção de clássicos. Além da excelente qualidade técnica da gravação (digital), as performances da orquestra English Consort e do coro da Abadia de Westminster, sob a direção de Simon Preston, são excepcionais, exprimindo toda a complexidade e exuberância da música barroca, ainda capaz de comover profundamente, após a passagem de quase 3 séculos.
Como assisti, nessa semana, ao concerto da "Missa em Si Menor" de Bach, cabe aqui um comentário sobre a comparação entre Bach e Handel, maiores mestres do período musical barroco, normalmente realizada por simpatizantes do gênero. Em minha opinião, pegando emprestadas as pinturas retratando o Cristo crucificado de dois artistas famosos, os espanhóis Velazquez e Goya, eu diria que as composições de Handel, habitualmente majestosa e de alto voltagem sentimental, se assemelha mais à representação teatral da famosa cena bíblica do quadro de Goya, enquanto Bach, com suas obras sacras, principalmente a "Missa em Si Menor" e as paixões de São Mateus e de São João, parece refletir com menor pompa e possivelmente maior sinceridade e realismo o sentimento cristão, o que o aproxima muito mais da crucificação de Cristo belamente representada na pintura de Velazquez. 
Bem, isso é apenas uma impressão pessoal! 

Francisco de Goya

Diego Velázquez