terça-feira, 20 de abril de 2021

Um país sem futuro?

Eles são (pra mim) a parte mais visível e comovente da crise que se instalou no país com essa pandemia. Trabalham em condições precárias e sem qualquer proteção trabalhista e social.
Por sua total conta e risco, saem por aí debaixo de sol e chuva, muitas vezes em bicicletas alugadas ou emprestadas, em troca de uma remuneração cada vez mais difícil de se obter no mercado formal de trabalho.
São jovens pobres (em sua maioria), sem instrução e qualificação, que assumem o papel de provedores da família quando ainda não estão preparados para tamanha responsabilidade.
Quando saio para comprar o almoço ou fazer minhas caminhadas diárias, vejo muitos deles circulando às pressas pelas ruas de Vila Isabel e Grajaú. Alguns ainda adolescentes. Isso me corta o coração.
Um país que não cuida de seus jovens não tem o direito de sonhar com um futuro melhor!
Essa é a nossa maior mazela!



O dia em que fui à praia na Bósnia.

Talvez essa tenha sido uma das mais singulares viagens que fiz nos últimos 25 anos.
Alugamos um carro em Zagreb, capital da Croácia, para cruzar o país de norte a sul. Foram longas horas viajando quase o tempo todo pelo deslumbrante litoral croata. De um lado, o Mar Adriático, do outro um paredão de montanhas cobertas de uma rocha branca que refletia intensamente a luz do sol.
A primeira estada foi em Zadar, uma bela cidade litorânea repleta de história e ainda com claros vestígios da guerra dos anos 1990.
Seguimos em direção ao sul permanecendo também por alguns dias em Split, outra encantadora cidade histórica marcada pelo conflito étnico que provocou a morte de dezenas de milhares de pessoas, entre civis e combatentes.
Era verão e cada atração local, a qualquer hora do dia, era disputada por uma multidão de turistas. A atmosfera, no entanto, já não refletia os dias sombrios vividos durante a guerra. O país estava se reconstruindo e os recursos do turismo permitiam ao povo olhar o futuro com esperança e otimismo.
Após duas noites, pegamos o carro e nos dirigimos ao sul para visitar a última cidade do roteiro.
Foi aí que encontramos a Bósnia, ou mais precisamente "Neum Corridor", estreito trecho do litoral (aprox. 20km) pertencente à Bósnia e Herzegovina, único acesso dos bósnios ao mar.
Era a hora do almoço e resolvemos fazer a refeição ali mesmo no restaurante da praia. Quando os garçons, muito gentis, souberam que éramos brasileiros, o tratamento se tornou mais informal criando uma atmosfera bastante amigável.
Um almoço singular acompanhado de uma ótima cerveja local, juntinho ao mar e num belo dia de sol. Tudo isso num país fora do roteiro e do qual eu só tinha ouvido falar no período da guerra, 20 anos antes. Uma experiência única e inesquecível!
Dali seguimos para Dubrovnik, onde permaneceríamos por mais alguns dias, cumprindo a última etapa do roteiro na Croácia. Mas é essa é uma outra história.



Tempo de resiliência e construção!

No dia em que acreditarmos que cada um de nós é responsável por tornar o mundo melhor, aí sim haverá esperança para a humanidade. O que fazemos em nossas relações pessoais e coletivas tem definitivamente o poder de inspirar o próximo, em especial os mais jovens, num esforço contínuo de evolução e construção da paz.
Mas vivemos um tempo de prevalência do egoísmo, do cinismo e da hipocrisia que teimam em "sabotar" nosso aperfeiçoamento espiritual.
Ou nos damos conta de nossa responsabilidade individual nesse processo evolutivo ou nada vai mudar tão cedo, retardando o avanço da civilização e comprometendo o futuro. É o preço que pagamos por nos deixarmos dominar por aquilo que nos torna menores e indignos da "centelha divina".
Sim, é tempo de resiliência, mas também de "construção", e cada um de nós pode e deve ser protagonista nesse projeto!



O avô ou "La Paloma"!

Na Filadélfia, em meio à depressão dos anos 1930, o pequeno Genaro (12 anos) quer ir à inauguração do novo cinema do bairro, mas não tem os 25 centavos do ingresso.
O avô (Al Pacino), muito doente, promete a Genaro que ele herdará uma moeda de 25 centavos assim que "bater as botas". Mas o velho não dá sinais de que vai "partir" naquele dia.
Dividido entre o desejo de ir ao cinema e o medo de perder o avô, Genaro resolve arrumar o dinheiro se oferecendo para pequenos serviços na vizinhança, mas o desafio é enorme porque a pobreza é geral no bairro.
Bem, o resto é spoiler e não posso contar!
"Um Dia para Relembrar" (Two Bits), de 1995, é uma obra "menor" na filmografia de Al Pacino, mas conta com um belo roteiro e diálogos inteligentes, além de desempenho convincente do jovem ator Jerry Barone no papel de Genaro.


Bruckner em 4 movimentos!

Demorou, mas encontrei!
Bruckner deixou sua última sinfonia (nona) incompleta, embora o longo e comovente adágio do terceiro movimento, com ares de despedida, sintetize de maneira comovente toda a extensa obra sinfônica do compositor.
Alguns esboços do quarto movimento resistiram ao tempo. Mais recentemente, em trabalho meticuloso, alguns estudiosos conseguiram reunir fragmentos (centenas de compassos) deixados por Bruckner, conferindo unidade ao movimento e um certo sentido de continuidade em relação ao restante da obra.
Esse cd contém uma das raras gravações da Nona Sinfonia de Bruckner em sua versão integral, como teria sido composta por Bruckner. Ou apenas uma das versões possíveis, conforme ocorreu com quase todas as sinfonias do compositor, alteradas pelo próprio Bruckner por sugestão e até "palpite" de terceiros.



Um filme "inesquecível"!

Esse filme faz parte da minha vida.
Era janeiro de 1975 e eu tinha 16 anos. A imprensa só falava da tentativa do presidente Francisco Horta de trazer Rivellino para o Fluminense, que andava mal das pernas, sem ídolos e sem conquistas importantes desde o campeonato carioca de 1973. Na época, a possibilidade de contar com Rivellino no Fluminense e no futebol carioca era algo quase inconcebível. De início, ninguém acreditava. Parecia mais uma jogada de marketing do Horta. Onde ele iria buscar dinheiro para tirar Rivellino do Corinthians? Impensável!
Mas o assunto rendeu por semanas, dando esperança à torcida tricolor de ver o tricampeão do mundo no clube.
Um certo dia, circulou a notícia de que Francisco Horta anunciaria à tarde o acerto com o Corinthians e com o próprio jogador. Os entraves iniciais teriam sido superados e nada mais impedia Rivellino de finalmente vestir a camisa do Fluminense. Não aguentando de ansiedade, resolvi ir ao cinema para passar o tempo, na expectativa da confirmação da contratação durante a sessão, o que de fato ocorreu. Mas eu só fui saber disso ao chegar em casa e perguntar ao meu pai. Não havia telefone celular nem internet e as notícias não circulavam com a mesma rapidez de hoje.
A alegria foi tanta que nunca mais esqueci daquele dia e do nome do filme (Irmão sol, Irmã lua), mas do filme mesmo eu não me lembro absolutamente nada. Muito tempo depois é que descobri que se tratava de uma biografia romanceada de São Francisco de Assis. O fato é que até hoje não tive a oportunidade de rever (ou ver!) o filme, o que ainda pretendo fazer para finalmente justificar aquele ingresso!



Quando tudo isso passar...

Quando tudo isso passar, e um dia haverá de passar, imagino como cada um de nós (ou aquele que sobreviver) olhará para trás lembrando de como se comportou (ação ou omissão) enquanto centenas de milhares de brasileiros perderam a vida nessa maldita pandemia, provocando tanta dor, desalento e infelicidade. Não me refiro apenas aos possíveis mortos entre familiares, amigos, colegas ou apenas conhecidos, mas a todos que morreram e certamente ainda morrerão antes do controle da doença.
Imagino como os "sobreviventes" olharão para trás lembrando da irresponsabilidade dos que se aglomeraram ou negaram a gravidade da situação expondo os demais, das autoridades que, por negligência, incompetência ou ideologia, falharam na condução da crise, e também dos cidadãos comuns que se comportaram com indiferença à dor alheia e com desprezo pela vida do próximo.
Teremos uma geração inteira marcada pela ação de um inimigo invisível que, por ironia, nos desmascara, revelando a verdadeira face de cada um de nós.
O rei e o povo estão nus!



Gunter Wand e o melhor Bruckner!

Estou impressionado com o que constatei agora ouvindo uma gravação da sexta sinfonia de Bruckner, sob a regência de Gunter Wand.
Nunca tinha ouvido nenhuma obra conduzida por Wand, um regente alemão com uma história de vida e profissional singular, que inclui resistência ao nazismo e decorrente prejuízo na carreira.
Ultimamente, lendo mais sobre as sinfonias de Bruckner, que ouço sem parar há dias, descobri que Gunter Wand é considerado o mais célebre condutor das obras do compositor austríaco. Um gênio inigualável, nas palavras de um grande especialista. Como eu, um viciado em Bruckner, não sabia disso? Estúpido!!
Para "tirar o atraso", resolvi procurar no YouTube um vídeo de Wand conduzindo justamente Bruckner e encontrei a sexta sinfonia, uma obra que já conheço de dois cds da minha coleção.
Em poucos segundos de execução da música, tomei um susto! Aquela não era a sexta sinfonia de Bruckner. Wand conferia ao solene primeiro movimento nuances de extraordinária beleza e definitivamente ausentes nas duas gravações que eu conhecia, ambas com regentes consagrados. A música transcorria como pequenas ondas, num contraste delicado e suave que revelava uma melodia nova, encantadora e de dimensão transcendental. E foi assim até o final, com direito a verdadeiras epifanias no belo adágio.
Tudo que eu tinha ouvido até então em outras gravações, e que já me agradava muito, me parecia agora extremamente linear, talvez fiel à partitura, mas conduzido sem a necessária sensibilidade, sem verdade e sem "alma".
Receio que só agora, com Gunter Wand, falecido em 2002, aos 90 anos, é que conheci Anton Bruckner. Um pouco tarde, mas, como diz o ditado, antes tarde do que nunca!



Chegadas, partidas e chamadas do exterior!

O programa "Chegadas e Partidas", originalmente transmitido no canal GNT e agora também no "Fantástico", me faz lembrar das viagens ao exterior de muitos anos atrás em que a única maneira (barata) de falar com o Brasil era por meio das "Lan Houses". Chegando ao hotel, a primeira providência era descobrir uma Lan House por perto. Lembro especialmente da viagem de 2006, cruzando a Europa, desde Roma até Heidelberg, na Alemanha. Em praticamente todas as cidades em que me hospedei recorri às Lan Houses para dar e receber notícias. Além das ligações telefônicas, era ali também que eu acessava meu correio eletrônico.
Nos últimos anos, com o surgimento principalmente do WhatsApp, tudo ficou mais fácil. Hotéis, bares e restaurantes já dispõem de redes wifi, e, dependendo da cidade, até da rua é possível fazer contato. Os tempos mudaram e a comunicação se tornou mais acessível e instantânea, mas o que se perdeu com tudo isso foi aquela expectativa pela chegada para contar as experiências da viagem.
O mundo gira!



Viajar não tem preço!

"É melhor presenciar algo uma vez do que ouvir sobre isso milhares de vezes" - Provérbio asiático.
Por pura sorte (e talvez oportunidade histórica), comecei a viajar justamente quando o real valia muito. Na primeira viagem, em 1995, o real valia mais do que o dólar e continuou valorizado por muito tempo. Naquela época, até a Europa era acessível para os brasileiros. Nos últimos anos, com a crise econômica, incluindo dois períodos de recessão, é que o cenário mudou, dificultando viagens para o velho continente, agora "proibido" para os brasileiros por conta da pandemia.
Aproveitei muito bem os melhores anos da economia brasileira para realizar um sonho de infância, conhecer a Europa, experimentando algumas das maiores emoções que tive na vida. Atravessei o continente de um jeito que mesmos os turistas endinheirados não têm a oportunidade de fazer. De trem, de carro e até de bicicleta, visitei cidades grandes, cidades pequenas e dezenas de aldeias no interior de vários países, incluindo algumas que nunca tinham visto um brasileiro, como ocorreu duas vezes no interior da Baviera.
Me perdi de carro na Croácia e nos alpes austríacos, fui à praia na Bósnia e Herzegovina, cheguei à capital de um país sem saber que estava no país, testemunhei a realização de uma Copa do Mundo no país-sede, peguei carona em ônibus escolar da R. Tcheca para a Alemanha, por duas vezes, quase dormi no carro por falta de hospedagem...
Enfim, nenhum dinheiro paga por isso. Não foi apenas uma questão de disponibilidade de recursos, mas de oportunidade, e isso não tem preço!



TGV e Paris, a primeira vez a gente nunca esquece!

Depois de passar meses sentindo saudade, mas com a emoção contida, finalmente as lágrimas rolaram ao assistir, agora há pouco, a um episódio de "Mundo Visto de Cima" mostrando Lyon e o TGV (Train à Grande Vitesse), trem francês de alta velocidade.
Lembrei-me da chegada à estação de Lyon no dia 15 de maio de 1995 (uma segunda-feira), após uma viagem noturna desde Barcelona, atravessando os Pirineus, cordilheira que serve de fronteira natural entre Espanha e França, e passando por Perpignan, Montpellier e Nimes, já no sul da França. Fazia uma manhã muito fria e a expectativa era grande para viajar no famoso TGV francês. Eram 7h e a chegada a Paris estava prevista para as 9h. O passe de trem (Europass), comprado ainda no Brasil, dava direito a um assento na primeira classe, com a condição de que eu fizesse a devida reserva de lugar ainda na estação, o que efetivamente providenciei assim que desembarquei do trem que me levou de Barcelona.
Na plataforma indicada, vestido com vários casacos, mas ainda assim quase morrendo de frio, e ao lado de dezenas de executivos acompanhados de suas vistosas pastas (não era tempo de notebooks e muito menos de smartphones), aguardei ansiosamente pelo TGV. Uns dez minutos antes das 7, o trem se aproximou da estação. Fui um dos primeiros a embarcar e procurei logo o assento reservado. Depois de colocar a mala no compartimento superior, finalmente me acomodei e relaxei. Em questão de minutos o vagão estava lotado. Todos, a maioria homens, impecavelmente vestidos e só eu ali (que eu me lembre) de calça jeans, tênis e mochila. O trem partiu na hora certa e, com uma sensação de "peixe fora d'água" (ou penetra), segui viagem, logo me distraindo com a bela paisagem e as fotografias de uma revista de bordo.
Mas não demorou muito para eu me sentir dominado por um sentimento misto de ansiedade por conhecer a mítica Paris dali a duas horas e o receio de chegar a um país sem conhecer nada do idioma. Até então eu só tinha visitado Portugal e Espanha. O resto da viagem, que incluía França e Alemanha, prometia muitas emoções e percalços por conta da comunicação, mas a sorte já estava lançada. E bota sorte nisso!!
Enfim, foi o início de um período de descobertas e novas emoções...
Aquela viagem mudou a minha vida, enriqueceu a minha vida, deu sentido à minha vida...
Sem as viagens, eu certamente seria outra pessoa e receio que menos tolerante e aberta à diversidade humana.
Novas culturas, hábitos, comportamentos, paisagens, visões de mundo...
Isso definitivamente não se aprende nos livros.
Por isso, agradeço a Deus todos os dias pela inspiração e coragem (também saúde e recursos) para superar o medo e viabilizar aquela mágica viagem de 1995.



O Rio dos anos 20!

Saudade de uma cidade que não conheci e de um tempo que não vivi!
A leitura de "Metrópole à Beira-Mar - O Rio Moderno dos Anos 20", de Ruy Castro, flui naturalmente em forma de uma rica e extensa crônica sobre a efervescência artística e cultural de um Rio de Janeiro ainda otimista e confiante no futuro. A modernidade europeia do início do século XX, com seus desafios e contradições, encontrava aqui terreno fértil para se instalar e se reproduzir.
Mas não durou muito. A partir dos anos 1930, a capital federal nunca mais foi a mesma, a despeito do rápido "espasmo" ocorrido no final dos anos 1950, com a visão "empreendedora" de JK, que se refletiu em todos os ramos de atividades, criando no imaginário de uma geração inteira de cariocas e brasileiros a visão de um Brasil próspero e moderno que o tempo infelizmente não "avalizou".
Voltando ao livro, o fato é que nunca mais o povo carioca teve tantos motivos para acreditar no futuro como nos anos 1920. A leitura é indispensável para quem deseja conhecer a História de uma cidade que já foi a legítima capital política, artística e cultural desse país. Uma cidade que se vê hoje tomada pela criminalidade em todos os níveis, pela desigualdade/insensibilidade social e por uma profunda crise econômica que se estende há décadas e que parece não ter fim.
Por último, vale dizer, trata-se de um livro precioso e fundamental para o registro da História não só do Rio, mas do próprio país. O volume de informações reunidas sobre o cotidiano da capital federal, com suas ricas manifestações populares e visitas de monarcas e de grandes artistas e personalidades estrangeiras, algo que nunca mais se repetiu na cidade, deve ser inédito nessa obra. Se eu fosse professor, usaria o livro em sala de aula para estimular em cada criança e jovem carioca o amor pelo Rio de Janeiro e o desejo de trabalhar para vê-lo de novo política, econômica, artística e culturalmente pujante, como a geração de nossos avós puderam testemunhar naqueles longínquos anos 1920!



Os clichês que não resumem a vida!

Revisitei “O Turista Acidental” ontem à noite e me lembrei desse comentário que fiz há alguns anos...
Ele odeia surpresas. Vive cada momento de acordo com o "planejado" e nada foge ao seu rígido controle. Tornou-se, então, autor de guias de viagens para pessoas que “detestam” viajar. Isso mesmo, seu público-alvo é formado exatamente por turistas que gostam de reproduzir nas viagens todas as facilidades às quais estão acostumados em suas rotinas diárias.
Quem já assistiu deve saber que estou me referindo a Macon Leary, o protagonista de "O Turista Acidental", uma adaptação para o cinema do romance homônimo de Anne Tyler, escolhida como melhor filme de 1988 pelo Círculo de Críticos de Cinema de Nova York. Assistindo ao filme, confesso que lembrei de um amigo que se parece muito com Leary, o personagem vivido por William Hurt. Ele (o amigo) não abre mão da rotina e receio que só não viajou até hoje para a Europa (um sonho antigo) porque não conhece um guia de viagens como o de Leary.
Mas todos sabemos que em viagens, como na vida, não é possível controlar e prever tudo, daí as dificuldades enfrentadas pelo personagem em sua história pessoal. A partir da trágica perda do filho de 12 anos, sua vida toma um rumo completamente inesperado, o que leva Leary a vivenciar situações novas, algumas desconfortáveis e outras que certamente o ajudarão a ver as coisas de maneiras diferentes.
Nesse sentido, não há nada no filme que contrarie mais as expectativas do personagem e da maioria das pessoas do que os acontecimentos mostrados na sequência final em que Leary, hospedado em Paris, resolve retornar aos Estados Unidos. Após arrumar rapidamente a pequena bagagem, ele deixa o hotel sentindo fortes dores na coluna. Na rua, à procura de um táxi para levá-lo ao aeroporto e não resistindo às dores, Leary acaba abandonando a maleta. Em seguida, ele avista um táxi parado de onde sai um adolescente. Com pressa (e dificuldade), Leary grita "espera", mas o motorista não ouve e arranca com o carro. O garoto, ao ver Leary e percebendo que ele desejava pegar o mesmo táxi, pede para o motorista esperar. O carro finalmente para e o garoto, com uma gentileza incomum, ajuda Leary a entrar no veículo, despedindo-se com um sonoro "bon voyage!!" antes de fechar a porta. Leary fica tão surpreso com a atitude do rapaz que o acompanha com o olhar por um bom tempo, como que não acreditando que aquele jovem tão atencioso e gentil fosse real.
Como sabemos, há poucas coisas mais previsíveis e familiares na vida do que o clichê. E não há maior clichê a respeito dos franceses (e dos parisienses em particular) do que a grosseria e o mau humor. Muitos podem até pensar que pessoas como o adolescente do filme só existem na ficção, mas não é verdade. Numa de minhas viagens, presenciei situações semelhantes exatamente em Paris. Um rapaz ajudou minha sobrinha a retirar a mala do vagão do metrô e, logo depois, uma senhora de meia idade chegou a carregar a mala dela pelas escadas da estação. Além disso, quando eu estava tirando fotos no interior da Conciergerie, um menino de aprox. 10 anos que integrava uma excursão escolar, ao ver que eu estava fotografando as celas, orientou os colegas para que se mantivessem afastados do local, uma atitude que desmente todos os clichês a respeito do povo francês.
Finalmente, acredito que a diferença (ou uma das diferenças) entre mim e Leary, o personagem, é que, após muitas viagens, aprendi que Paris e a vida definitivamente não se resumem aos clichês.



A atualidade do romantismo de Heine!

Heinrich Heine é um dos mais celebrados poetas e escritores alemães. Suas obras, escritas há dois séculos, permanecem atuais, e seu estilo irônico é curiosamente semelhante ao de Machado de Assis, que teria se inspirado no escritor alemão, conforme afirmam alguns estudiosos. O brasileiro, encantado com Heine, chegou a traduzir suas obras para o português.
Fica difícil imaginar um homem com a cabeça ou a mentalidade de Heine na Alemanha do início do século XIX, embora ele tenha sido contemporâneo de Goethe. Suas ideias românticas e humanistas ainda encontram eco num mundo cada vez mais desigual e insensível.
"...As crianças, pensei comigo, por serem mais jovens do que nós, ainda conseguem se lembrar de quando elas também eram árvores e pássaros e, por isso, ainda são capazes de entendê-los. Nós, porém, já somos velhos e temos preocupações em excesso, jurisprudência demais e muitos versos ruins na cabeça...".
"Viagem ao Harz", Heinrich Heine.



Bach e os tempos difíceis em que vivemos!

A "Paixão Segundo São Mateus", composta por J. S. Bach, descreve um dos episódios bíblicos mais representativos da fé cristã, as últimas horas de Jesus e sua crucificação. Nessa obra-prima, o compositor dá um testemunho eloquente de sua profunda religiosidade.
A arte de Bach pode perfeitamente nos ajudar a compreender e enfrentar essa época de tantas incertezas, dor e sofrimento. Um período sombrio que desafia (ou reforça) nossa fé em Deus e em sua misericórdia!
Sobre a "Paixão Segundo São Mateus", Nietzsche, célebre filósofo alemão, afirmou:
- Quem desaprendeu totalmente a cristandade tem a chance de ouvi-la aqui como um verdadeiro evangelho!



Expulso do bar em Praga!

Estávamos os três, eu e meus amigos, passeando por Praga já há algumas horas e deu aquela vontade terrível de urinar. Praga é linda e convida a longos passeios a pé, mas banheiro público não vimos nenhum na cidade, nem mesmo pago, como é comum encontrar nas grandes cidades europeias.
Depois de procurarmos um banheiro por horas, recorremos a um daqueles bares antigos de Praga, com cheiro e cara de séculos de história.
Era cedo ainda, final da tarde, e não havia clientes. Só vimos um homem no balcão, bastante ocupado para perceber nossa entrada "sorrateira".
Após "esvaziar a bexiga", o desafio era sair do bar também sem ser percebido. Meus amigos foram rápidos e saíram na frente, mas foram vistos pelo funcionário. O babaca aqui, pra variar, foi o último a sair e acabou ouvindo pelos três todos os impropérios tchecos possíveis. O homem até tentou me alcançar. No final, deu pra ouvir, em claro e sonoro inglês, que ali não era banheiro público.
Confesso que, já do lado de fora, me senti como uma criança pega em flagrante "aprontando mais uma", mas o que seria das viagens sem esses "incidentes" e lembranças?
Há 15 anos...


Viena e seu passado de vanguarda!

Muita gente associa Viena a óperas de Mozart e valsas de Strauss (pai e filho), mas, há pouco mais de 1 século, a capital austríaca já foi considerada de "vanguarda". É verdade que Viena já há muito deixou de dar as cartas no ramo das artes, mas na virada do século XIX para o século XX a cidade tornou-se palco da "Secessão", um movimento iniciado na Alemanha (Munique e Berlim) e, em seguida, estabelecido em Viena (1898) por um grupo de artistas liderados por Gustav Klimt, onde se propagou em resposta aos padrões acadêmicos e conservadores predominantes na época. 
No mesmo período, também floresceu na cidade a chamada "Segunda Escola de Viena", movimento musical integrado por um grupo de compositores "modernistas" (Arnold Schoenberg, Alban Berg, Anton Webern etc.), que se caracterizou pelo emprego do atonalismo e do dodecafonismo na música, linguagens até hoje apreciadas apenas por parcelas reduzidas de melômanos. Após 100 anos, linguagens musicais ainda de vanguarda ou definitivamente "sepultadas"? 
O fato é que Viena, uma cidade que parece sempre voltada para seu passado glorioso como capital de um império e da música clássica, já teve também seus dias (ou anos) de vanguarda nas artes, apontando novos caminhos e inspirando movimentos artísticos e musicais. Hoje, quem caminha pelas ruas centenárias da cidade ainda percebe no ar um certo orgulho pelo passado imperial e rica herança cultural, refletidos nos monumentos que dominam seu centro histórico. 
 Se os artistas de vanguarda de nossos dias já não se inspiram no que acontece em Viena, ao menos não podem ignorar tudo o que a capital austríaca representa para a arte ocidental.


"Espanha Vista de Cima" e irresistível!

Excluindo o desnecessário tom "épico" da música, trata-se de um filme indispensável para explorar e conhecer toda a beleza da Espanha. 
Como já disse algumas vezes, nenhum país europeu aproveitou tão bem os recursos recebidos ao passar a integrar a União Europeia como a Espanha. O país pobre e eminentemente agrário que atravessou boa parte do século XX ficou (espero) definitivamente para trás. Tive a rara e rica oportunidade histórica de acompanhar atentamente os acontecimentos na Espanha desde a primeira visita que fiz ao país, em 1995, para conhecer os primos de Barcelona. Nesse período, a Espanha experimentou uma fase de crescimento econômico invejável e sem precedentes em sua história recente. Esse enriquecimento, decorrente, em grande parte, do ingresso do país na União Europeia, em 1986, beneficiou a maioria da população, propiciando fortes investimentos sociais (saúde, educação, infraestrutura etc.) e uma melhor distribuição da riqueza nacional. Tudo que vi, li e ouvi em todos esses anos me leva a acreditar que a Espanha viveu até a crise econômica de 2008 sua verdadeira "Belle Epoque". Foram anos consecutivos de prosperidade que mudaram o perfil do país, aumentando a qualidade de vida da população e atraindo legiões cada vez maiores de imigrantes, na maioria latinos e africanos, em busca de melhores oportunidades. 
Talvez o país ainda não tenha se recuperado totalmente, a exemplo de muitos outros, da crise de 2008, mas lançou até ali os sólidos alicerces que lhe permitem superar desafios e seguir em frente integrando o seleto grupo de países mais ricos e estáveis do continente. Esse belíssimo filme não me deixa mentir e oferece o mais justo testemunho de tudo isso! 
Quando me lembro do rico legado da Olimpíada de Barcelona, em 1992, o maior já proporcionado a uma cidade na história dos Jogos Olímpicos da era moderna, fico com uma pontinha de inveja e também uma enorme vergonha ao constatar nosso fracasso com os JO do Rio. Mas essa é uma outra história.